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Podemos, América do Sul e república plurinacional

Por Salvador Schavelzon, no Lobo Suelto! | Trad. UniNômade

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Podemos vem sendo analisado de várias formas: como dispositivo discursivo que consegue captar a atenção midiática; como força política que irrompe e ameaça o bipartidarismo; como partido dos indignados e produto do 15-M; como aparelho que transmuda pluralismo e mobilização em centralização partidária de horizonte social-democrata; como combinação pós-moderna de chavismo com esquerda pró-soviética; como futuro para o sul da Europa mediante soluções para uma política asfixiada pela austeridade.

Aqui ensaiaremos outra leitura, nos perguntando de que forma a proposta do Podemos se relaciona com o caminho seguido pelos governos progressistas da última década na América Latina. Em especial, nos interessa explorar a plurinacionalidade como um dos “significantes vazios” que o grupo de Pablo Iglesias mobiliza ao tratar da questão da soberania catalã, e que nos remete diretamente aos processos constituintes da Bolívia e do Equador. De fato, e guardando as distâncias, alguém que compare os movimentos e posicionamentos do Podemos com esses processos, estudados ou acompanhados de perto por três dos cinco fundadores do grupo, não poderá evitar uma sensação de deja vu. Ela não é suficiente para prever um curso análogo, mas é o bastante para tecer hipóteses que abram um parêntese no entusiasmo generalizado pela possibilidade de mudança.

A aparição cedo da plurinacionalidade, como parte da convocação de uma Assembleia Constituinte, diz muito sobre o Podemos, para quem a experiência latino-americana parece ter mostrado o caminho para a criação de um instrumento eleitoral que aposte no fortalecimento do estado-nação e amortize a mobilização das nacionalidades, a fim de impulsionar crescimento com foco no social. Como componente de projetos políticos que partilham desta perspectiva no “tabuleiro político”; a plurinacionalidade constitucionalizada na Bolívia e Equador, agora proposta por Podemos, se adapta ao objetivo de dissuadir projetos de autodeterminação territorial sob a sombra do estado de bem estar e de um chamado à pátria de todos.

Pode-se resumir esta proposta política partilhada como solução estatal para temas sociais, sem rupturas a respeito do marco do capitalismo. Na demarcação de seu espaço no imaginário político-discursivo, se opõe, por um lado, o liberalismo e os bancos contra os despejos e hipotecas do estado espanhol ou contra as privatizações e a autonomia do Banco Central na América do Sul. Por outro lado, este projeto se coloca longe de formas de pensar o comum que não sejam as do social, longe de formas que poderíamos associar à comunidade e à rede, presentes quando encontramos projetos de autonomia, autogestão e horizontalidade, para a organização do comum.

Não é apropriado associar o Podemos com a social-democracia, apesar de propostas deste tipo, porque na definição de seu lugar político é fundamental a crítica à cumplicidade do socialismo europeu com o caráter antipopular e os partidos de raiz conservadora ou liberal. Este projeto que amigos e inimigos descrevem como “populismo”, na Bolívia e no Equador é remetido ao bolivarianismo de Chávez, em Chávez se aludia ao peronismo de Péron, e desde o peronismo, hoje kirchnerista, as referências mitopolíticas nos levam outra vez à Europa, mas aquela do passado, com ainda outras modulações importantes em cada passagem destas. Em todas, é o povo contra a oligarquia (ou o poder financeiro internacional) a conformar uma sociedade na busca de sua realização a partir do estado, interpelando indivíduos e seguidores em vez de povos ou coletivos em movimento.

O partido e o estado, como formas organizadas do social, recortam redes e verticalizam conexões a partir de uma ideia do social que prioriza a coesão à diferença, e se dirige desde acima a uma sociedade composta por indivíduos, um selo sociológico moderno compartilhado com o liberalismo. A partir de uma proposta pós-neoliberal, a chegada de governos progressistas na América do Sul ou na Europa supõe várias vezes que o indivíduo rompa o isolamento consumista e atue unido mediante o voto que, em alguns casos, pode vir acrescido da mobilização. Mas o impasse com a sociedade que individualiza é efêmero, ao restabelecer-se rapidamente a promessa de assistência ou inclusão de sujeitos concebidos como necessitados de mais estado, muito distantes dos novos rostos de um comando que poderia tentar governar diferente, mas sim a partir do mesmo lugar, e cheio de cinismo, impotência e continuidade.

A esse lugar de hegemonia e projeto de mudança bastante específicos, apesar de sua ubiquidade discursiva, se pode chegar partindo de muitos lugares, e é dessa maneira que se podem convocar maiorias sociais. Embora poucas vezes passem a representar as lutas e os desejos dos muitos, essa proposta política sempre fala a partir da universalidade, como força que somente funciona se for expressão de todos, e não como setor ou ideologia que poderá participar de coalizões ou frentes do ponto de vista da parcialidade.

Embora a esse lugar se chegue desde o socialismo, o catolicismo, o progressismo liberal e o nacionalismo; desde a Epistemologia do Sul, o pós-operaísmo italiano e a Esquerda Unida ou o trotskismo do Secretariado Unificado pela IV Internacional; a posição de chegada é a de um instrumento de todos os cidadãos, da gente, do povo indignado, e a partir daí falam o kirchnerismo e o chavismo, Rafael Correa ou Pablo Iglesias: somos o povo, podemos e sorrimos. Podemos só funciona como um “todos” que representa a Espanha. Fora ficam apenas a oligarquia, a ultraesquerda, os que rompam a unidade e aqueles que a percam.

Quanto mais crescer o grupo e ligar-se com lutas, nada terá sido dito, apesar das tendências, sobre o que é fundamental: quanto tempo de crescimento terá que ter o Podemos antes de chegar ao governo, quanto a ansiedade por ganhar deixará espaço para a construção desde baixo. Mas, por enquanto, observamos que a formalização do Podemos como partido de autoridades que decidem no dia a dia, e votantes esporádicos sobre questões secundárias ou candidatos assinalados pelo líder, deixou perplexos os protagonistas das ruas no momento anterior.

O modo de crescimento adotado pela organização foi de seguidores que delegam e autoridades que prevalecem, em vez de corpos e diferenças que se enredam e se  ligam desde a horizontalidade. Veremos também se esta é uma crítica injusta e testemunhal, que desconhece as tarefas pesadas exigidas para a mudança, ou se realmente desse modo escolhido se perde uma oportunidade única para construir formas novas num momento em que os contornos das instituições modernas estão se esfacelando, cada vez com menos legitimidade.

Para coletivos urbanos, imigrantes, mulheres, precários desconectados sem documentos, ou povos soberanos que, como indígenas e movimentos horizontais latino-americanos, não concebem a participação política enquanto sociedades de indivíduos e cidadãos da nação delegando ao estado e ao partido o vetor político de mudança, o Podemos renunciou rápido demais em explorar todo o alcance de seu voo. Enquanto isso, o fechamento sem fissuras ao redor de um comando político blindado, e a pátria espanhola como referência identitária — ainda que justificada como estratégia, tal qual no progressismo latino-americano, para alguns é parecido demais com o que se deveria transformar antes de qualquer coisa.

Numa Europa que conheceu os problemas do nacionalismo e vê recrudescer atualmente os conflitos étnicos e civilizacionais, se entende o lugar de uma esquerda laica, moderna e republicana que busque distanciar-se de movimentos que considera desvios da política social e defesa do estado de bem estar, concebidos como prioritários. A partir de uma Europa das diferenças, apesar disso, os limites da república e do que representa a Europa, com sua social-democracia totalmente cooptada pelo capital, o projeto iluminista fracassado como companhia inseparável da violência colonialista, e uma modernidade que em seus extremos mostra seu lado mais obscurantista, estão tão à vista quanto a continuidade republicana do colonialismo nos Andes sul-americanos.

É nesse sentido que, desde uma proposta espanholista e social, ainda que seja republicana, plurinacional e antimonárquica, pareça haver muito pouco do sentido comum nascido nas praças ocupadas em 2011. Voltando à América Latina, se remete menos às lutas indígenas e populares contra o neoliberalismo, do que ao seu termidor desenvolvimentista multicultural. É esta a aprendizagem dos fundadores de Podemos na América Latina, como projeto social que absorveu a plurinacionalidade e a alterou ao modo do liberalismo que reduz diferença e autonomia a relativismo cultural, e um nacionalismo que concebe o estado como instrumento central para organizar a vida e a comunidade.

A perda da ambiguidade dos governos sul-americanos

Os governos sul-americanos da última década trazem algumas chaves de leitura possível para a proposta política de Podemos, e não somente por motivos biográficos de seus fundadores. A experiência política de governos que deslocaram bipartidarismos e partidocracias, que surgiram depois de importantes mobilizações antineoliberais, oferecem um ponto de vista que ajuda a imaginar o que seria um governo europeu de caráter “popular”. Mais do que exemplos concretos a seguir, tais governos oferecem um ponto de vista e uma “narrativa” que já provou a sua eficácia enquanto dispositivo, para impor-se eleitoralmente baseando-se na reivindicação do social frente a bancos e recortes antipopulares.

Essa narrativa serve como demonstração que, depois de ditaduras e anos de mobilização nas ruas e praças, é possível — e que “si, se puede” — ter governos surgidos das lutas sociais, do voto crítico ou da indignação popular. Esses governos conseguiram consolidar-se politicamente guiando períodos de crescimento macroeconômico sustentado, depois de fortes momentos de crise. No terreno eleitoral, foram encontradas fórmulas para obter apoios eleitorais que superaram os 50% em reiteradas disputas.

Longe de uma demagogia meramente eleitoralista que liberais assustados denunciam em Podemos, a disputa midiática se estendeu mais além das eleições, com diversas medidas que permitiram aos governos antagonizarem com o passado, a elite e as oligarquias partidárias, contrárias aos interesses da “pátria”. Sem necessidade de mudanças estruturais que interferissem na dinâmica da distribuição de renda e a relação com o mercado, a narrativa popular bastou para sustentar governos e abrir algumas frentes de batalha. Na Venezuela, Argentina, Equador e Bolívia, a polarização com quem se opõe aos interesses do povo excedeu o tempo eleitoral, apesar de que também esteja claro que as alianças para governar sugerem transversalidade com os poderes de sempre, em vez de antagonismo.

É notório o sentimento de família entre os governos progressistas sul-americanos que se erigiram deixando para trás épocas de “ajuste neoliberal”, e a proposta de Podemos – e Syriza – numa Europa comprometida com a austeridade. Desde esse lugar, os diversos governos encontraram espaço político para debater-se com o poder financeiro e os fundos “abutres”, recuperar algo de protagonismo para o estado e combater a pobreza, principalmente extrema. A partir de uma realidade distinta, sem dúvida, há uma mesma posição de sujeito na instalação do ponto de vista que, de Chávez a Mujica, ressoa quando Podemos propõe caminhos políticos e marcos constitucionais para uma mudança que, sem embargo não romperia com Espanha, a União Europeia e o Euro, o capitalismo e, seguramente, com a OTAN.

Devemos notar que o diálogo elogiável que Podemos em sua fase ascendente entabula com a política latino-americana nem sempre leva em conta os becos sem saída, encontrados por processos que se desdobraram em pactos excessivos com o passado, na aceitação de setores da velha política que nunca se foram e na tolerância com lastros inesperados que impuseram distância a movimentos e antigos aliados. Uma debilidade congênita para atacar privilégios e injustiças antes denunciadas se mostraria estrutural, nos governos sustentados com acordos de governabilidade expostos como necessários, e consensos conservadores no manejo da exploração de recursos e na expansão capitalista no campo, com graves consequências ecológicas e de preservação dos territórios.

Na contramão do sentido comum da esquerda libertária contemporânea e de imaginários pós-68, e talvez por isso um contraponto que funciona nas tertúlias televisivas contra a direita conservadora e o regime pós-franquista de 1978, Podemos buscará reconstruir e disputar uma identidade homogênea de um povo unitário. Cidadãos que apoiam a partir das suas casas e encontram novos representantes para substituir os desgastados, aparecem assim como a contraface de assembleias e redes sem centro, ao que somente certa leitura despistada qualifica de ineficazes e sem efeitos, como se o cenário atual não se devesse à magnitude daquele fenômeno.

Como diz Juan Carlos Monedero, os processos latino-americanos ajudaram o Podemos a aprender e não repetir erros, e menciona que o Que se vayan todos de 2001, assim como outras revoltas, os alertou de que é necessário uma alternativa com capacidade de fazer governo e não somente impugnar [1]. Movimentos de protesto, assembleias e ocupações do espaço público se reconhecem meramente como antecedente primitivo e mitologizado que necessariamente deverá dar lugar a uma institucionalização em que todos participem, mas a partir dos telefones celulares, enquanto “os mais preparados”, como propõe Iglesias, sejam convocados pelo partido para governar.

É o estado pra onde se devem dirigir necessariamente todos os esforços, nesta visão, como catalisador de impulsos imaturos de um momento de protesto que doravante se decreta encerrado. Disparando um deja vu ainda antes de aceder a algum governo, vemos essa discussão quando Podemos opõe “ganhar” a “protestar”, na proposta que, em janeiro de 2015, a Carolina Bescansa fez como parte de um debate numa reunião interna de Madrid, mas que na América do Sul já levou à prisão ativistas e líderes indígenas no Brasil e Equador, somente por protestar contra os governos de que antes eram aliados. O mesmo juízo se adivinha na frase que “se não estão gostando, montem um partido e ganhem as eleições”, com o que agora governos progressistas também desafiam mobilizações contra medidas que afetam o bolso ou formas de vida nos territórios.

A condução do Podemos, que busca fazer exatamente o que líderes como Lula da Silva ou Rafael Correa propõem a seus críticos — formar um partido e ganhar — pensa parecido quando enfrenta “eficácia” de frente às eleições, frente à democracia interna e o pluralismo que a própria força política convocou. Nesse sentido, o debate que acompanhou a Assembleia Cidadã de Vista Alegre, quando se formava a organização, teve Pablo Iglesias anunciando que procuraria um dos lados caso não obtivesse a maioria, mas que se ganhasse queria listas completas em todos os postos de autoridade partidária, como medida necessária para ganhar. Ainda, além disso, buscaria integrar com sua gente os Conselhos Cidadãos das comunidades, onde as listas teriam chances de rivalizar.

É mérito do Podemos mencionar os processos latino-americanos como inspiração distante, ainda que não modelo, rompendo com a geopolítica colonial do conhecimento, em que costuma ser mais usual que os países do sul sejam contraexemplo e os da Europa modelo a imitar, justificativa para qualquer medida ou reforma. A presença de muitos hoje quadros de Podemos na América Latina e noutros lugares, apesar disso, é muitas vezes explicada por eles mesmos menos como intercâmbio produtivo e vital, e mais como necessidade de sair do país obrigada pela crise devido à falta de oportunidades. Em várias apresentações a que assistimos entre os que correram para postular algum dos cargos do novo partido, se trata de heróis que saíram por causa da crise e voltaram pela pátria, entidade sempre útil e lembrada quando se busca aceder ao governo, mandar à guerra ou trabalhar.

A América do Sul oferece à Europa, sem dúvida, um rico repertório de negociações soberanas de dívidas ilegítimas e políticas pontuais, mas também um problema político irresolvido quanto à tolerância com o desflorestamento ilegal da Amazônia, o extrativismo contaminador nos Andes e o avanço predatório da fronteira agrícola para monoculturas transgênicas rentáveis, com suas consequências irreversíveis, já causadoras de secas e inundações, resultado  do uso descontrolado dos recursos tidos como fundamentais para sustentar políticas sociais e manter o crescimento e o consumo em alta. Esses temas não podem ser abordados como abusos corrigíveis, nalguma possível versão melhorada, se trata antes disso de componentes inseparáveis de modelos econômicos e projetos políticos, ao que Podemos parece integrar-se, a julgar por posicionamentos passados de seus fundadores e propostas atuais nos novos debates.

Como todo deja vu que devolve um passado sempre ubíquo e incompleto, o lugar a partir de onde ler Podemos na América do Sul é disputado e instável. Um primeiro impulso leva aos anos 90, com o auge e a queda de presidentes neoliberais, bem como a líderes campesinos como Evo Morales, ou populares como Chávez, ou cidadãos próximos da gente, como Chacho Álvarez, que impulsionaram seus partidos com destinos diferentes mas inimigos similares. Embora os governos progressistas que se consolidaram nos anos 2000 mantinham um ar eleitoral até o presente; na América do Sul também se evoca o Podemos na busca de uma nova força política, no momento em que retornam os protestos e o neoliberalismo denota continuar.

Assiste-se na América Latina a um novo ciclo de mobilizações pela vida, o comum e o território, na metrópole e comunidades, com movimentos sociais ou de participação eleitoral, mas por caminhos políticos em que o objetivo não é a construção de uma hegemonia que conduza a um novo estado, ou a acumulação de força eleitoral para a remoção de partidos antipopulares, apesar de essas lutas não se oporem a isso. A partir deste lugar, que não é o de nostalgia por mobilizações passadas nem de um anarquismo que impugnaria qualquer institucionalização, a irrupção do Podemos parece tão alheia quanto poderia ser para todo aquele que não considere terminadas as formas coletivas que reverberaram no 15-M, ou na busca da mudança social com autodeterminação.

O significante vazio confunde o soberanismo catalão que qualifica Podemos de novo cavalo de Troia madrilenho do espanholismo, mas também como a melhor interlocução possível na cabeça do estado espanhol. A ambiguidade também aparece no novo partido que tanto é produto do 15-M, quanto a sua traição e antagonista. Se, com efeito, a posição de sujeito em afinidade com os governos sul-americanos se constitui como próximo governo espanhol, muitas dúvidas seriam rapidamente dissipadas. Como tem acontecido, sem embargo, a capacidade de representar uma esperança — polarizar com o neoliberalismo, mas governar com ele, — poderá manter-se. De qualquer modo, as inquietações das ruas e movimentos já podem ser enunciadas, como faz Uli Brand sobre a Syriza e a Europa em geral:

Nos comentários, se repete uma ou outra vez a cantilena pálida do ‘crescimento’ necessário. Mas, o que significa isso concretamente? Concretamente, que tipo de empregos serão gerados ou conservados? Estamos falando de empregos na indústria bélica, ou numa indústria produtiva o mais sustentável possível? Do trabalho de peões mal remunerados, na agroindústria? Ou de trabalhadores com emprego digno na produção ecológica de alimentos? E quem decide sobre as inversões que devem nos levar ao crescimento? Fundos privados de alto risco em busca do maior rendimento possível, ou empresários responsáveis, ou inclusive a população, mediante mecanismos e procedimentos de democracia econômica?” [2].

Podemos e a plurinacionalidade

Em seu discurso em Barcelona, fechando o esplêndido ano de 2014 para sua recém criada agremiação, Pablo Iglesias falou de respeitar o direito dos catalães de decidir sobre o seu futuro. Algo básico desde o ponto de vista da esquerda universitária que simpatizou com movimentos globais e latino-americanos, mas inédito para um partido nascido em Madrid, que tem possibilidades de obter a presidência do governo. Isso sim, Pablo Iglesias esclareceu em Barcelona: para que haja direito a decidir seria necessário também decidir sobre a economia e outros assuntos. Qualquer decisão vinculada à soberania, para Podemos, deve estar sujeita à abertura de um processo constituinte geral.

Logo ao assumir o cargo de secretário geral, no teatro Apolo de Madrid, em 15 de novembro de 2014, Pablo foi claro em detalhar em que medida o Podemos está de acordo em consultar os catalães: a “relação jurídica que querem ter com o resto do estado.” Pablo não escondeu, em várias declarações, que gostaria que os catalães “não fossem embora” e “ficassem conosco”, mas a sua posição não é a de Rajoy. Em Barcelona, falou da necessidade de “estender pontes em vez de elevar muros”. A tradução desses desejos em termos de estrutura do estado tem a ver com o reconhecimento de que a “Espanha é um país de nações” e a proposta de que “possamos construir um futuro plurinacional juntos”, agregou no mesmo ato de 21 de dezembro, em Barcelona.

O objetivo de Iglesias não é incorporar os setores soberanistas das comunidades que contam com fortes movimentos independentistas. As pesquisas mostram que Podemos não fecha com elas, mas sim, com mais incidência, com os votantes desencantados dos partidos espanhóis, bem como entre novos votantes não entusiasmados com a luta pela autodeterminação nacional. Trata-se de encontrar uma saída ao desafio catalão que permita dispersar um nacionalismo que, desde a perspectiva de esquerda ou social, não é julgado como autêntico ou essencial. Em lugar de confrontar o soberanismo, se propõe um modelo de estado que o contemple, sem no entanto perder o comando estatal requerido para efetuar mudanças sociais.

Depois que a Catalunha foi a comunidade com os piores resultados para o Podemos na eleição para o parlamento europeu, em 2014, o partido parece ter encontrado a forma de usar a mobilização soberanista a seu favor, tanto no impulso de um processo constituinte mais amplo, como no desvio do descontentamento catalão para outro tipo de saída. Íñigo Errejón definiu que “Para nós, a Espanha é um país plurinacional, em que a cola deve ser o acordo livre e a sedução” [3]. Seduzir significa conseguir que os catalães fiquem, atraindo um número suficiente de seguidores para cimentar mudanças no estado espanhol.

As pesquisas dizem duas coisas interessantes para Podemos. Uma é que seu avanço na Catalunha coincide com o retrocesso do independentismo. Na pesquisa de dezembro de 2014, enquanto Podemos se convertia num ator de peso também para a política catalã, se registrava pela primeira vez, desde o início das mobilizações soberanistas, que ele não se impunha sobre o sim à independência [4].

O outro dado que seguramente foi avaliado pelo Podemos para propor uma solução plurinacional foi que, nas medições de junho de 2014, nem o sim nem o não à soberania plena se impunham quando se incluía uma “terceira via”, pela qual se aumentavam as competências sem necessidade de uma ruptura secessionista [5]. Estes votantes, cerca de um terço do eleitorado, é o que interessa a Podemos para somar nacionalmente e impelir uma plurinacionalidade em que um bom número de catalães se vejam refletidos, rompendo a aliança soberana popular e neoliberal.

Para que esta proposta caia bem no público eleitoral, terreno preferido na análise estratégica do Podemos, é chave que a narrativa do social chegue ao “cinturão vermelho” de Barcelona, um dos focos de Pablo Iglesias em seu discurso de dezembro, enquanto associava a casta espanhola coma catalã, e criticava o abraço de Artur Mas (da CiU) com David Fernández (da CUP), símbolo do encontro conjuntural do soberanismo popular com o da casta neoliberal. O cinturão industrial da área metropolitana de Barcelona poderia assim ser a chave, e Podemos descobre isso quando parece recolocar em seu bastião o Partido Socialista Catalão, a partir do que não é casual que também se fale em estado plurinacional como uma estratégia para o debate soberanista.

Gemma Ubasart, secretária de Plurinacionalidade do conselho estatal de Podemos, ex-colaboradora da Tuerka [NT. Programa televisivo de debates que foi embrião do Podemos] e que, como investigadora pós-doutora também passou pelo Equador, a chave para o caminho da sedução. Como candidata à secretária geral da agremiação na Catalunha, resume a sua visão se colocando bem longe do soberanismo:

Temos um importante desafio à frente, construir um país de coesão e bem estar para todos, e livre de corrupção” [6].

A partir de um modelo mais multicultural do que confederado e autodeterminativo, a tendência parece ser apostar por uma consulta ao povo catalão em que uma maioria soberanista não se imponha, canalizando desejos de soberania em uma forma que permita manter o caráter unitário do estado, desde onde efetuar mudanças ou encadeamentos do tipo social, tal qual assistimos em Bolívia e Equador.

Boaventura de Sousa Santos, de cuja equipe toma parte Juan Carlos Monedero, e a quem este se refere como seu mestre, escreveu muito sobre a plurinacionalidade latino-americana, destacando-a como parte de um novo constitucionalismo experimental e pós-colonial que permite superar as formas modernas em países com mais de uma nação, e que inclusive foi mencionado pelo sociólogo português como possível solução para palestinos e judeus num novo estado secular compartilhado [7]. Esta proposta de estrutura do estado é adotada pelo movimento indígena em Bolívia e Equador, como caminho para aceder a uma autonomia territorial, mas se cimentou constitucionalmente de forma aberta e indefinida.

A plurinacionalidade aparece, então, como o significante vazio que pode permitir a Podemos repartir as cartas num eventual processo constituinte que o tenha como protagonista, sem recorrer ao federalismo, proposto pelo PSOE e desacreditado pelo provado centralismo de velho tipo desse partido, e sem definir, no entanto, quanto se cederia em concreto de soberania e autodeterminação. O ponto de partida aberto fica claro na entrevista de Pablo Iglesias em que o indefinido de sua proposta, claramente, não deixa de ceder ante ao privilégio do social:

Que modelo territorial o Podemos defenderá em Catalunha?

Temos dito sempre que a Espanha é uma realidade plurinacional e é preciso atender a essa plurinacionalidade para qualquer arranjo político.

Mas em que se baseia esse modelo? Em um estado federal ou num mais centralizado que elimine competências?

Coloquemos em cima da mesa num processo constituinte todas as opções e vejamos qual é a mais eficaz para assegurar os instrumentos soberanos. A mim, o que importa é que haja uma saúde pública para todos, que se está atendendo em catalão, em euskera [língua basca], galego ou castelhano, para mim é uma questão secundária” [8].

O desejo de autonomia e descolonização não é considerado pelos povos indígenas nem por nenhuma nação que se entenda enquanto tal como uma questão secundária que seria abordada depois de solucionar, desde o estado, a questão social. No processo boliviano, a língua e o território, inseparáveis das formas comunitárias de justiça e democracia, formariam parte de reivindicações em que se busca avançar  a par das demandas sociais e soberania nacional ou popular, sem hierarquização e com pleno reconhecimento. Esta visada política que nasce no indianismo do altiplano e inspirou a nova Constituição da Bolívia foi descrita como “os dois olhos”, como o avanço sempre inseparável contra a discriminação étnica e opressão de classe.

A articulação de demandas de autodeterminação com direitos sociais pode soar familiar pensada a partir de uma posição como a da esquerda nacionalista basca do Euskadi, e algumas vozes embarcadas no soberanismo catalão. Assim, vemos que desde o periódico Gara de Euskal Herria, o pesquisador alemão Raúl Zelik manifesta entusiasmo por Podemosmas também cautela, quando escreve: “A ruptura com a continuação franquista tem dimensões diferentes: o tema das nações periféricas não urge menos do que as exigências sociais e democratizadoras da esquerda estatal.” [9].

Poderia pensar-se que, com a posição de sujeito que vemos nos governos progressistas e em Podemos, a dos povos indígenas sul-americanos se encontraria com os que não se veem parte de um projeto de pátria espanhola com coesão e bem estar. Nos processos de Equador e Bolívia, deve-se ser mais exato, os processos constituintes se abriram e levaram adiante a partir de uma aliança entre organizações sociais e indígenas e os novos governos. A partir de 2008 e 2009, apesar disso, conflitos reiterados levaram uns e outros a distanciarem-se.

Como poderá acontecer em Espanha, se há setores soberanistas que embarcam na proposta de Podemos, hoje nos países que incorporaram este modelo, o plurinacional é disputado a partir do estado e, também, desde a oposição que continua em sua busca de autonomia, não mais em cumplicidade com governos que vê distantes na defesa de uma plurinacionalidade vazia. O cenário é provável se pensamos que Podemos precisa das comunidades para abrir um processo constituinte formal, e que possa vir um governo que se mostraria mais aberto a negociar uma consulta, como Escócia, ou Quebec, no Canadá.

O Podemos que surge como deja vu dos processos sul-americanos da última década é o do distanciamento de demandas descolonizadoras e de autodeterminação, na renúncia das buscas de alternativas ao desenvolvimento, que construam uma nova institucionalidade pós-republicana e antiliberal desde a comunidade, as ruas ou o debate constitucional. A multiplicidade do caráter minoritário que o pluralismo iria exprimir se reduz a um problema de assistência social para os iguais antes que diferentes, carentes antes que singulares, numa concepção que só pode derivar em mais estado e menos plurinacionalidade.

A plurinacionalidade na Bolívia

O processo constituinte boliviano viveu uma situação política marcada pela recondução da reclamação de autonomia por regiões, povos e nações, a partir de uma narrativa política que punha ênfase na intervenção econômica e nos direitos, dirão alguns, mas em Bolívia se viu a força com que reivindicações regionalistas por autonomia (ou retorno dos poderes do governo, no caso de Sucre, a capital constitucional) podem tanto abrir como fazer naufragar uma Assembleia Constituinte e um processo de mudanças.

Num relato adotado por Podemos, o intelectual e acadêmico vice-presidente da Bolívia, Álvaro García Linera, analisa a chegada do governo de Evo Morales e do MAS [10], como a transformação de uma maioria social numa maioria política. A gente comum, de rosto indígena, chegava em 2006 ao palácio de governo, com novos gestos e modos, como inclusive a Europa foi testemunha quando, em seu primeiro giro internacional, causou sensação à “chompa” de Evo Morales, de forma similar a símbolos poderosos como o rabo de cavalo de Pablo Iglesias, as sandálias de Mujica, e a “simplicidade” do papa Francisco quando telefona a uma monja ou se detém a conversar com os guardas.

Os gestos podem transformar-se em medidas políticas, e Evo Morales fez isso não tanto com a incorporação da plurinacionalidade, que na prática não mudou a institucionalidade nem o pacto territorial do país, senão com um decreto que mudou a relação com as empresas estrangeiras de hidrocarbonetos de forma favorável à Bolívia, atendendo a uma demanda surgida da mobilização popular que destituiu um presidente em 2003, em que já haviam avançado os movimentos com pressão do parlamento. O mesmo seria a esperada reversão da reforma do artigo 135 da constituição espanhola, pactuada pelo PP e PSOE em 2011, que blinda a austeridade, e cuja reforma deverá ser acompanhada de medidas destinadas à situação da moradia e da saúde pública.

O dado crucial, no curso do processo constituinte boliviano, é que para garantir a continuação de Evo Morales e suas políticas sociais, foi necessário articular a proposta que se traduziu constitucionalmente como “Estado plurinacional, unitário, social, de direito e com autonomias”. O modelo autônomo era inspirado no modelo espanhol, destinado a contemplar a reivindicação de mobilizações regionais que ameaçavam o governo central, uma vez que as mobilizações indígenas haviam possibilitado a ascensão do presidente campesino indígena.

Para aprovar a constituição e viabilizar o governo, foi necessário desarticular as demandas autonomistas do leste do país, curiosamente defendidas em nível nacional por uma “agrupación ciudadana” que também se chama Podemos (“Poder democrático e social”, liderada por Tuto Quiroga), embora neste caso era inocultável a associação de seus líderes com a velha “casta” colonial anti-indígena, derivada de partidos reciclados da ditadura e que até então sempre haviam governado. É muito provável que, em Madrid, os fundadores de Podemos associem esses setores autonomistas com a variante neoliberal do soberanismo, encabeçando mobilizações especialmente na Catalunha.

No movimento que buscava neutralizar as demandas de autonomia a partir da região mais rica do país, o MAS também iria se afastando de projetos de autonomia indígena e campesina, justiça e democracia comunitária, territorialidade coletiva para povos, que no auge da disputa com as regiões acompanhou com seu apoio, inclusive como forma de debilitar os regionalismos a partir de demandas indígenas de autonomia contra elites dos departamentos e províncias.

Se podemos associar o desafio separatista e autonomista da região da Media Luna em Bolívia com o soberanismo basco e catalão; uma diferença entre o MAS de Evo Morales e o Podemos da Espanha, é que o primeiro tinha a seu lado as lutas descolonizadoras e de autodeterminação das nações indígenas, fundamento essencial da plurinacionalidade. Elas se manteriam fiéis até a aprovação da constituição, quando diferenças no bloco popular se tornariam irreconciliáveis. Frente ao Podemos, as demandas de autodeterminação veem seu surgimento com desconfiança, portanto numa aproximação das situações deve mirar-se primeiramente a hostilidade da Media Luna e, em segundo lugar, o momento de ruptura da aliança entre o governo e os indígenas, posterior à aprovação da nova Constituição.

Corriam os anos de 2006, 2007 e 2008, e Pablo Iglesias publicava (organizado com Espasaldín López), o livro Bolivia en movimiento. Acción colectiva y poder político, enquanto outros futuros membros de Podemos assessoravam os governos de Bolívia, Equador e Venezuela. A oposição a Evo Morales fundamentava a sua proposta de autonomias com assessoramento de políticos catalães associados ao partido socialista, imitando também o projeto de Estatuto que, desafiando o governo central, fora aprovado pela população dessas regiões em referendo que se propunha como vinculante.

Em formulação teórico-política ligada aos processos constituintes de Bolívia e Equador, o constitucionalismo plurinacional não somente superaria o multiculturalismo, como também se diferenciaria do constitucionalismo social, de inspiração nacionalista ou bolivariana; assim como do constitucionalismo liberal, embora combinara alguns de seus traços e incorporara vários de seus elementos. A riqueza destas propostas era a sua capacidade de articulação de horizontes, sem que o social e o nacional eclipsassem, entretanto, a autodeterminação indígena.

O que diferenciava o plurinacional de outros constitucionalismos era a introdução de um vetor comunitário, descolonizador e de autonomia indígena campesina. Estes elementos permitiam um relance do processo boliviano com o neozapatismo de Chiapas e não somente o bolivarianismo de Chávez, com sua ênfase no estado e no presidencialismo de caráter centralizador. A proposta do Pacto de Unidade refletia as visões de organizações campesinas e indígenas das terras altas e baixas do país. Dali surgia um modelo de estado que tinha muito de não-estatal, reconhecendo as formas tradicionais de governo e justiça, assim como todas as línguas indígenas como oficiais, em todo o território nacional e não somente nas regiões em que falam [11].

Nas lutas que precederam a Assembleia Constituinte, e na defesa por parte das organizações indígenas e intelectuais próximas a elas, o plurinacional avançava também com o vivir bien (em espanhol da Bolívia), suma qamaña (em aimara) ou buen vivir (no Peru e Equador) e suma kawsay (em quéchua), como alternativa ao desenvolvimento, em construção que buscava formas de vida inspiradas no comunitário e no tom das críticas ao capitalismo industrial e o desenvolvimento modernizante “desde acima”. Na Bolívia, significaria a introdução da Pachamama como parte do mundo comum, enquanto no Equador se introduziam na constituição direitos da natureza que buscavam quebrar com a concepção antropocêntrica e passiva sobre o meio ambiente.

Mais que no desenvolvimento destas discussões, o recurso do plurinacional por parte do Podemos parte de um deslocamento de sentido ocorrido no período pós-constituinte, notório no governo da Bolívia e do Equador, embora neste último país, ele teve uma relevância constitucional menor. Uma vez os governos afiançados no poder, e ao mesmo tempo em que a agenda do desenvolvimento e da exploração extrativista dava lugar a importantes conflitos territoriais entre governo e povos indígenas, o termo plurinacional começou a separar-se da questão indígena, referindo-se melhor a ideias como inclusão e igualdade de oportunidades. Simultaneamente, a forma movimento do MAS cedia ante um governo que se autonomizava na tomada de decisões e se impunha como cabeça condutora centralizando tudo no chefe de estado, do partido e dos sindicatos de produtores de folha de coca.

Num processo constituinte disputado, a inclusão da plurinacionalidade na caracterização do estado boliviano, não tinha sido acompanhada no desenvolvimento de instituições ou formas estatais correspondentes. Esta releitura que tira do plurinacional a sua força de luta étnica e de autonomia, foi a que permitiu encontrar a chave do processo, para enredar um consenso com setores internos aos “processos de mudança”, mas alheios ao projeto histórico de descolonização e governo indígena do país; assim como para destravar na Assembleia Constituinte e no Congresso, em Bolívia, a difícil maioria qualificada cuja chave estava nas mãos da oposição.

O resultado de um acordo que tomou tempo e disputa nas ruas para chegar permitiu isolar as demandas autonomistas e canalizar o processo às transformações econômicas e à defesa de um desenvolvimento que buscara um “salto industrial”, nas palavras do vice-presidente García Linera, e que convidou Pablo Iglesias como conferencista em Bolívia pouco depois de seu triunfo nas europeias, além de ter incluído uma conversa na Universidade Complutense como parte de um giro oficial pela Europa, ainda antes que as eleições europeias de maio tivessem projetado Podemos como voz da política europeia.

Atrás da imagem de um governo indígena ou comunitário, emergiria em Bolívia uma identidade política que se aproxima mais do nacionalismo e do popular. Observadores como Pablo Stefanoni, Fernando Molina descreveram este perfil, enquanto García Linera preferiria enfatizar o indianismo e o evismo. Estas identidades entram na disputa de significados em que está o jogo da definição do que seja o indígena, flutuante nos censos e que desde o governo tendia a definir-se de maneira genérica e remetendo ao popular, recordando a velha imagem nacionalista da mestiçagem (como identidade nacional proposta pelo estado), e deixando de lado a singularidade étnica e a busca da autonomia, importante em projetos de reconstrução das formas originárias que foram marginalizadas no projeto oficial.

A identidade de esquerda, com seus símbolos e palavras de ordem, também deixariam a linguagem política cotidiana na Bolívia, de maneira parecida como o Podemos entrou no jogo eleitoral, em janeiro de 2014. Em termos constitucionais, uma plurinacionalidade construída à margem dos projetos dos povos que buscavam novas institucionalidade a partir de seus territórios, formas de representação parlamentar coletiva, e que também participaram da Assembleia Constituinte e se mobilizaram por ela, permitiria cimentar a refundação do estado mantendo um modelo centralizado, visto como necessário para evitar o desmembramento trágico na história do país, e também para garantir as políticas sociais e ingressos estatais pela exploração de recursos naturais.

Com o significante vazio da plurinacionalidade e do viver bem, se neutralizava inclusive o recurso a um modelo federal. A viabilidade política deste modelo era difícil de assegurar num contexto em que se pressionava para que o estado central cedesse o controle de todos os hidrocarbonetos e outros recursos, num momento de expansão econômicos e alta dos preços das commodities, base para as políticas sociais, aumento de reservas e estabilização da moeda, além de cimentar a participação estatal na economia. A capacidade do conceito “plurinacional” para a realidade espanhola parece ser, justamente, a sua flexibilidade, como o poder de conotar autodeterminação e respeito a nações igualitárias, mas também unitarismo e menos descentralização. Falta saber ainda se a reforma tributária poderá fazer no estado espanhol as vezes dos campos de hidrocarbonetos, da soja e do minério na América do Sul. Mas está claro que a plurinacionalidade se presta, sem dúvida, a ser o pagamento de um país indiviso que reconheça soberanias distintas.

O que o MAS de Evo Morales conseguiu na Bolívia foi o que Pablo Iglesias parece necessitar, já que não quer que os catalães deixem a Espanha, e sua agenda definitivamente aponta às fissuras do social. Na Bolívia, foi essa a transformação do conceito plurinacional, depois de um processo constituinte acidentado em que era frequente ouvir falar de guerra civil, em que as regiões opositoras declaravam a autonomia de fato e onde, depois de uma matança de indígenas em Pando, da tomada das instituições nacionais em Santa Cruz, e da ratificação de Evo Morales num referendo convocatório em que logrou o apoio de 67%, o governo conseguiu abrir uma mesa de negociação que derivou na aprovação da constituição e a extinção da demanda autonomista.

Para entender as modulações do plurinacional seria importante usar como chave de leitura que, enquanto o autonomismo regional era neutralizado, os indígenas também perdiam a cumplicidade com um governo que apostava no desenvolvimento. As bases campesinas do MAS eram mais apoios a incorporar-se numa articulação campesino-indígena com organizações de povos minoritários e setores intelectuais e de esquerda ativos no processo, que buscavam o fortalecimento da comunidade, a autonomia e alternativas de desenvolvimento. Este modelo que estimulava sobretudo a produção e exploração de recursos para a exportação se tornou dominante em toda a América Latina, com uma semelhança cada vez maior entre os governos bolivarianos, plurinacionais e progressistas, com outros de outro signo político nos países vizinhos: Peru, Colômbia, México ou Paraguai.

Na Bolívia, o indianismo inspirado pelo rebelde indígena Tupac Katari tem sido o espaço intelectual e político desde onde a plurinacionalidade foi introduzida, embora se registrem referências relacionadas ao modelo soviético de nacionalidades, impelidas por partidos comunistas e oficinas de pesquisadores russos em toda a região andina. Desde esta mirada que enfatiza a comunidade e a diferença indígena, hoje se avalia, apesar disso, que o processo de mudança se aproxima das formas de nacionalismo estatal contra o que sempre tinham enfrentado nas lutas de descolonização por um governo índio, ou pela indianização da Bolívia.

Por outro lado, se por um lado a vigência das formas ancestrais ou reinventadas indígenas são parte de um debate na Bolívia, também é certo que aimaras e quéchuas prósperos e bem integrados no mercado capitalista devem ser considerados em sua confluência com o projeto estatal de direitos, longe do indianismo que não renuncia a pensar-se como alternativa civilizacional, mas também desde a identificação indígena. Estes setores são parte das classes trabalhadoras que, em toda a América do Sul, aumentam a sua participação econômica e capacidade de consumo, talvez como na Europa e Estados Unidos do pós-guerra, mas hoje com supostas novas “classes médias” que os governos progressistas festejam.

As duas plurinacionalidades e a república

Não há um significado mais verdadeiro do plurinacional, e seu emprego em novos contextos implicará transformações, mas talvez mantenha atualidade na Europa o fato que em suas versões sul-americanas o conceito tem duas almas: surge de lutas indígenas por autonomia e descolonização, buscando a partir da comunidade alternativas ao desenvolvimento capitalista, mas se consolida como símbolo de um projeto estatal que promete crescimento econômico e expansão do consumo com base num modelo de desenvolvimento com ênfase na exploração de recursos naturais, apostas pela industrialização e políticas sociais de transferência de renda para a inclusão.

A plurinacionalidade entusiasmou povos indígenas que lutaram nas ruas contra o liberalismo e a abertura de um cenário constituinte, mas hoje aparece atravessada em Bolívia e Equador, pelas dificuldades de romper com o desenvolvimento convencional e o modelo de crescimento de capitalismo pretensiosamente “social”, também presente na Venezuela, Brasil, Uruguai e Argentina. Este lugar político, que às vezes parece imaginar uma sociedade do trabalho e a produção de mais de meio século atrás, pode permitir estabilidade política e econômica como na Bolívia, e propostas keynesianas como as defendidas por Áxel Kicillof na Argentina, e Vincenç Navarro e Juan Torres para Podemos e Esquerda Unida na Espanha; mas resulta intolerável para quem vê seus direitos e formas ameaçados pela intrusão exploradora em seu território, e para quem não é incluído a partir de suas diferenças, mas da evocação de um povo abstrato a partir da visada do universal.

A ideia de plurinacionalidade aparece, então, como tensão, na medida em que busca exprimir e reconhecer a autodeterminação e a autonomia de povos e nações como a catalã ou do povo galego, mas no marco de uma proposta onde o eixo é a mobilização afetiva da consciência (mono)nacional ativada contra banqueiros alemães e a oligarquia da casta nacional. A partir deste lugar, se abre um diálogo com a esquerda na crítica à desigualdade social e os abusos do capitalismo, mas com soluções concretas pensadas de cima para baixo, em relação a processos que podem incluir grandes mobilizações, mas que não fazem de seus participantes sujeitos ativos na construção de um mundo novo, mais além dessa condução desde acima, sem enclausurar-se nas decisões. Trata-se melhor de falar desde os grandes meios de comunicação ao povo feliz ou cidadão-massa que consume e vota, protegido pelo estado e “os mais capacitados para governar”, que Podemos prometeu chamar.

Esta visada sensível desde cima com a situação “social” dos de abaixo remete a uma identidade política compartilhada na América Latina que aceitou como projeto a administração mais humanitária do capitalismo, embora seja certamente crítica ao neoliberalismo a partir de uma sensibilidade nacionalista e social. O consenso sobre essa visada política ficou à vista na recepção entusiasta do papa Francisco como último grande fenômeno midiático na política sul-americana que também explorou esse espaço político exortado pela igreja alguns dias depois da morte de Chávez.

Apesar de desacordos do passado com a igreja e com Bergoglio, os governos progressistas celebraram a sua chegada por motivos parecidos aos de Pablo Iglesias, quando o aplaudiu no parlamento europeu. O apoio cúmplice com a crítica papal aos abusos do capitalismo contrastou com a saída do recinto de outros eurodeputados que não fizeram ouvidos de mercador sobre a degradação dos direitos das mulheres e homossexuais; recebido com paternalismo pela igreja de Francisco, mas sem reconhecer livre de pecado a sua autodeterminação. Retirar do programa eleitoral ou não dar ênfase ao direito ao aborto e o casamento gay, vem sendo justificado pela necessidade de vencer, na suposição de mentalidade conservadora que se tem dos votantes. À luz dos processos sul-americanos, apesar disso, o que saiu do programa para as eleições nunca voltou a entrar e, na verdade, atuou ao contrário — nestes e noutros temas — desde uma moderação que se prolonga por cálculo de governabilidade, ou convicção de quem se vai somando quanto mais firme a consolidação no poder.

As organizações indígenas de maior representatividade em Bolívia e Equador, campesinos sem terra e populações levantadas contra a contaminação mineira, abriram os processos constituintes mas hoje estão num lugar de excomunhão. É assim que o Podemos se desenvolve como resposta possível — e necessária — se pensamos no melhor que se pode fazer a partir de uma narrativa “Espanha” para milhões de sem ocupação, pobres e desamparados. Se outros horizontes se eclipsam e Iglesias pode seguir falando de crescimento, emprego e reforma tributária, assim, estará em seu território e será imparável. Numa política que se encontra mais além do povo enquadrado e mais além de um centralismo espanholista, para muitos esta não será a melhor mudança possível a ser construída.

Para quem, antes que pobre ou sem emprego de uma Espanha integradora se reconhece como mulher, minoria sem estado, coletivo urbano ou imigrante sem nação, Podemos deixará de falar a ela muito rapidamente. Se  a ideia de país que busca construir se assimila a sua ideia de partido, como parece; poderá suceder que a plurinacionalidade se definirá contra a autonomia, como ocorreu na Bolívia e Equador, quando o termo deixou de referir-se a nações específicas no marco de um mesmo estado.

Embora a plurinacionalidade surja no debate em oposição ao reconhecimento multicultural, incorporado em várias constituições latino-americanas na década de 90, com as reformas neoliberais, o momento em que para os indígenas o conceito perde o interesse, é o que o transforma em sinônimo de inclusão de todos nas formas políticas anteriores, como integração do colonizado antes do que descolonização que para os povos indígenas se refere a aceitar uma pluralidade de formas de organização, desenvolvimento e autonomia. No lugar de autonomia e produção comunitária, a plurinacionalidade que prevaleceria em Equador e Bolívia seria a da possibilidade que um indígena não seja discriminado e inclusive possa ser presidente, mas sem superar o modelo de reconhecimento do tipo liberal, reduzindo a diferença ao multiculturalismo, e a forma republicana da democracia capitalista para a política sempre transcendente e isolada.

A presença indígena nos processos políticos andinos, em lutas zapatistas pela autonomia, ou frente à mineração ou avanço do agronegócio em Paraguai, Chile e Brasil, vem permitindo a construção de novos horizontes políticos que ponham em diálogo o ancestral com o comunitário, em debates bem atuais para quem também nas cidades sente os limites das formas modernas de representação política, em sua cumplicidade com um capitalismo que destrói o planeta e privatiza o comum, inclusive em suas variantes de tipo nacionalista ou social.

Quando os povos indígenas são levados em conta como identidades rígidas reconhecidas pelo estado desde a cultura, a plurinacionalidade se desliga da cosmopolítica indígena e da comunidade, os direitos da natureza e a inclusão dos não-humanos, referência que se origina na socialidade e no viver bem indígena, mas que é referência também para o ambientalismo, a política e a filosofia da ciência contemporânea. S partir deste lugar, é possível pensar um diálogo entre lutas do estado espanhol e latino-americanas, onde viagens políticas como dos bascos a Cuba e Chiapas, exílios mútuos e imigrantes constroem faz tempo as bases para conversar.

É claro que nem toda luta por autodeterminação se liga com as redes indígenas e a política das comunidades, assembleias e praças. Tem sentido a suspeita de Pablo Iglesias sobre o soberanismo neoliberal, eixo das contradições antes e depois da independência para qualquer militante sincero contra o colonialismo de Madrid. O que se entende no Podemos e a direção atual de vários processos sul-americanos é que a resposta ao neoliberalismo seja desde a nação e o estado, em suas formas moldadas desde sempre pelo capitalismo, exatamente como toda ditadura ou governo autoritário.

No idioma de Podemos, que é o do estado, o social leva ao econômico, como variáveis macro que resultarão em direitos efetivos para indivíduos-votantes, reduzindo a diferença à esfera do cultural, como se a organização em rede ou comunitária não fosse, ao mesmo tempo, cultura, política e economia, mesclada antes que separada em esferas que se administram desde acima. Nesta visada, o soberanismo e a autodeterminação se reduzem à língua e bandeira, como símbolos subordinados ao social e o político, e não como mundos sem limites para voltar a pensar no comum. Arrasando a austeridade e o regime de 78, mas não muitas de suas determinações, uma nova hegemonia garantirá o novo ciclo do capitalismo europeu na Espanha, talvez plurinacional, talvez republicano, certamente com menos protagonismo para os povos do que para o estado.

Ainda depois de chegar ao governo, a presença inédita de indígenas e campesinos no estado manteve vivo o projeto de descolonização, entendido como mudança das formas políticas com que haviam sido sempre governados. Nesse sentido, na nova Constituição da Bolívia, promulgada em 2009, o preâmbulo dá conta do alcance com que se introduz a ideia da plurinacionalidade: “Deixamos no passado o estado colonial, republicano e neoliberal. Assumimos o desafio histórico de construir coletivamente o estado unitário social de direito plurinacional comunitário”. Pouco depois, Evo Morales firmava um decreto em que se substituía a denominação do país de “República de Bolivia” por “Estado Plurinacional de Bolivia”.

O antirrepublicanismo tinha no estado espanhol um sentido obviamente diferente, com a monarquia dos Bourbon ainda em pé e a lembrança da realização republicana também presente. Nos Andes sul-americanos, essa forma política se associou com a continuidade do colonialismo que nunca permitiu acesso das maiorias a direitos cidadãos, e este ponto é essencial pra entender o impulso inicial da plurinacionalidade. Referia-se à busca de formas políticas mais democráticas, inspiradas na comunidade indígena, mas para muitos adequada também para as grandes cidades. Esta ideia de plurinacionalidade vinha com uma proposta de refazer o mapa do país, hoje produto de poderes dos “caciques” e oligarquias que desenhavam a seu gosto a territorialidade do país. Neste sentido, reunia força de mudança a política das autonomias e, mais além da república, uma política de abertura a outras civilizações e à pluralidade.

No Podemos, se fala da eleição do chefe de estado e não da república, por estratégia. O limite que encontramos na nova formação, não é o de retomar ou não esta bandeira, senão pensar a política desde a necessidade de pensar as instituições e os instrumentos de organização, como formas que não são neutras. No mesmo sentido, os processos plurinacionais de Bolívia e Equador desenvolvem um ponto essencial contra a tradição moderna europeia, cujo lado colonial não é visível somente na América.

No discurso supracitado de Pablo Iglesias em Madrid, quando a estrutura do partido se formalizava, o líder do Podemos chamou a “recuperar a Europa para os cidadãos, os trabalhadores e trabalhadoras. E recuperar aquilo do que somos filhos: liberdade, igualdade e fraternidade”. Disputar para o povo conceitos como república e democracia apropriados pelo capitalismo é importante. Mas vale a pena refletir também porque essa frase ocorre de ser evocada por liberais e conservadores contra o “populismo”, onde deveria radicar a diferença e multiplicidade de todo povo antes do que de um fechamento vertical ante a própria pluralidade.

Como significante vazio, no estado espanhol, a república poderá combinar-se com o plurinacional como ocorre no Equador da “Revolução Cidadã”, ou era postulado em Bolívia por Juan del Granado, do progressismo urbano de La Paz antes aliado e, agora, opositor ao MAS. O importante é o modo em que permite expressar a diferença e o pluralismo, que em Bolívia abria um terreno de experimentação institucional que não se limita aos princípios políticos modernos, por suas alternativas para pensar a propriedade comum, a representação direta e formas de economia e decisão que não são as do capitalismo e do estado.

Outra coisa é o fechamento pragmático ao redor do imediato, seja por correlação de força, concepção política ou aposta pelo já dado. Foi neste contexto que a forma república foi reincorporada ao imaginário do processo de mudança, disputando um termo inicialmente introduzido na Constituição a instâncias de oposição ao MAS, cujo lugar enunciativo era do estado de direito, além da república e da nação. Como todo processo de mudança, a participação inicial de campesinos indígenas no processo boliviano, logo terminada, deixou como legado a ideia de que seria bom enterrar algumas palavras e formas cunhadas pelos que queremos remover.

A mudança de ênfase e transformação do plurinacional foi expressado pelo vice-presidente García Linera, que reconheceu o caráter republicano do projeto de mudança, num momento em que o debate boliviano questionava a saturação retórica do discurso oficial com elementos de origem indígena, empregados de forma contraditória com o desenvolvimentismo e que se manteria já sem conexão com os projetos plurinacionais de mudança com que haviam sido inicialmente associados. A redução do indígena a um romantismo folclórico fundamentava uma volta à política liberal e republicana, como se termos como igualdade, liberdade e inclusão não fossem eles próprios abstrações retóricas contraditórias com o que ocorre na vida social.

Havia algo que se perdia enquanto o desenvolvimento substituía a descolonização. A mudança ficou clara quando García Linera, próximo de 2013, associaria o conceito de plurinacionalidade à proposta de Estado Plurinacional Continental Latino-Americano. O projeto latino-americanista e bolivariano tinha o custo do distanciamento das reivindicações indígenas de autonomia territorial e comunidade para as quais, no passado, García Linera teve muita abertura em sua militância indianista-marxista. Na fundamentação desta proposta, acompanhada de uma visada que põe em foco o social e, como Podemos, reduz a diferença a uma questão de reconhecimento cultural, o vice-presidente diferenciava as “nações políticas” (dos distintos países sul-americanos) das “nações culturais”, indígenas campesinas, que tinham aberto com sua mobilização um processo constituinte, mas que na nova plurinacionalidade estatal e continental ficariam marginalizadas.

Quando vemos o lugar do poder como impotente e muito mais condicionado do que condicionante, seria injusto atribuir a Podemos ou a Evo Morales e García Linera o curso semântico que tomam os distintos significantes no contexto de um processo político. Confiemos melhor em que, quando a máscara de Fernando serviu de escusa para iniciar um esguicho de lutas libertárias em toda a América Latina frente ao avanço de Napoleão em 1809, nem o retorno do rei nem o restabelecimento do estado pode impedir que nossas redes, povos e comunidades sigam buscando caminhos de autonomia e autodeterminação.

 

Salvador Schavelzon, autor de A assembleia constituinte da Bolívia: etnografia do nascimento de um estado plurinacional (2010), antropólogo social, é professor na Unifesp.

Tradutor: Bruno Cava

NOTAS

[1] Juan Carlos Monedero en “A Cara Lavada” de la Radio Pública Argentina 29/7/14. https://www.youtube.com/watch?v=8tRHWxmZq74

[2] Uli Brand “¿Un nuevo comienzo para Europa?” Rebelión, 24/1/2015. http://www.rebelion.org/noticia.php?id=194691

[3] Errejón: “Los catalanes tienen derecho a decidir como los escoceses” 13/11/2014 El País. http://politica.elpais.com/politica/2014/11/13/actualidad/1415892800_413245.html

[4] “El no a la independencia de Cataluña gana al sí por primera vez desde 2012”, El País, 19/12/2014. http://ccaa.elpais.com/ccaa/2014/12/19/catalunya/1418984873_128596.html

“La irrupción de Podemos trastoca el plan independentista”, El País, 22/12/2014. http://ccaa.elpais.com/ccaa/2014/12/22/catalunya/1419283809_571655.html

[5] “Más Cataluña pero dentro de España” (Àngels Piñol) El País, 25 de julio 2014. http://ccaa.elpais.com/ccaa/2014/07/24/catalunya/1406230479_555975.html

[6] Gemma Ubasart: Nunca antes un partido con opciones de gobierno había defendido el derecho a la autodeterminación. El Diario, 15/1/2015. http://www.eldiario.es/catalunya/politica/Gemma-Ubasart-Jamas-Espanya-autodeterminacion_0_345766548.html

[7] Ver por ejemplo el libro Reinvención del Estado y Estado Plurinacional, Santa Cruz de la Sierra, CEJIS, CENDA, CEDIB, 2007. http://www.boaventuradesousasantos.pt/media/reinvencion%20del%20estado%20y%20estado%20plurinacional_Bolivia.pdf y sobre la propuesta para la cuestión Palestina: http://outraspalavras.net/posts/a-possivel-extincao-do-estado-de-israel/

[8] Entrevista Pablo Iglesias: “En las próximas elecciones habrá dos opciones: PP y Podemos” (Eva Saiz / Francesco Manetto) El País, 18/1/2015. http://politica.elpais.com/politica/2015/01/17/actualidad/1421526937_154439.html

[9] Raul Zelik “Podemos y la «revolución democrática» en el Estado”, Gara, 07/01/2015. http://www.naiz.eus/es/actualidad/noticia/20150107/podemos-y-la-revolucion-democratica-en-el-estado

[10] Movimiento al Socialismo, partido fundado como instrumento político dos sindicatos cocaleros e campesinos do país, que adotou esse nome quando uma facção da falange boliviana cedeu a sigla ao movimento que diferentes travas impediam de apresentar-se nas eleições. O processo de chegada ao governo, habitualmente considerado rápido, foi de 10 anos.

[11] O catedrático da Universidade de Sevilha, Bartolomé Clavero opõe o constitucionalismo plurinacional, com eixo nos direitos indígenas, do bolivariano, com mais ênfase no presidencialismo e no estado. Rubén Dalmau, Albert Noguera e Viciano Pastor, da fundação CEPS, e Gerardo Pisarello, da Universidade de Barcelona, preferem englobar as constituições de Bolívia, Equador e Venezuelano mesmo marco de um novo constitucionalismo latino-americano. Roberto Gargarella apresenta uma visão crítica deste constitucionalismo pós-colonial, que vê com muita continuidade com o constitucionalismo latino-americano do século 19.

 

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