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A luta não parou nem vai parar

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Foto: Juntos!

Por Marcelo Castañeda e Bruno Cava

Hoje, 13 de fevereiro, o movimento de lutas organizado no Rio de Janeiro obteve uma grande vitória. Uma vitória contra a operação policial articulada por um telejornalismo interessado em frustrar toda e qualquer possibilidade de dissenso. O ato contra o aumento da passagem hoje teve pelo menos 3 mil pessoas, que caminharam da Candelária até a sede da Prefeitura na Cidade Nova, passando pela região da Central do Brasil, um percurso de muitos quilômetros vencido num carnaval de cartazes, cantorias, marchinhas e animação.

Na Central, foram lembradas as duas pessoas feridas de morte: o cinegrafista Santiago Andrade (atingido por um rojão) e o camelô Tasman Accioly (atropelado por um ônibus), cujo luto a mobilização compartilha. Ouviram-se os gritos “Fifa, vigarista, quem tá na rua não é terrorista”, “Cadê o meu cachê?” e o onipresente “Não vai ter Copa”. Está claro como o movimento não se intimidou com as sucessivas ameaças de criação da lei antiterrorista, inclusive com o flerte do governo federal. Está claro como o risco de o Brasil se tornar uma Palestina ou Colômbia tem mais chance de ser estimulado por uma legislação de exceção assim, do que evitado.

Foi uma vitória porque, como na última segunda-feira, a manifestação soube reconstruir a atmosfera de alegria e criatividade. Não se rendeu às provocações do cerco policial, nem da grande imprensa, que está polarizando a questão para forçar um enfrentamento suicida. A mídia corporativa, com a Globo à frente, tenta a todo custo colar nos protestos a sensação de medo e pesadume, enquanto incita o sistema penal a “endurecer” contra manifestantes e quaisquer formas de auto-organização, concentrando-se, em especial, na tática de defesa “black bloc” (um entre tantos fenômenos inovadores deste ciclo de lutas). Foi uma vitória estratégica não entregar a faca e o queijo a eles, que continuam dia após dia aliciando fascistas, passando a “senha” para atos de justiçamento, ódio e demonização.

Como vimos hoje, a estratégia de desmoralização dos protestos não está colando em toda a sociedade, como os barões da imprensa gostariam. A capacidade de autoconvocação e autodefesa das mídias alternativas tem se mostrado fundamental para frear as engrenagens punitivas e demonizadoras. A capacidade de produzir contradiscurso, de reorganizar os meios e táticas, e sobretudo de disseminar afetos, tem diferenciado a atuação da multidão em relação ao estado. Se o funcionamento do estado tem sido impor o terror, a manifestação é vida.

Isto não significa dicotomizar amor x conflito. Mas perceber que o conflito se preenche de amor quando calcado sobre pautas afirmativas de direitos e o desejo de existir, em meio às opressões e discriminações, em meio ao sofrimento de uma cidade sem democracia. Já o conflito quando é realizado pelo estado não tem amor: é somente medo e tristeza, fábrica de morte para perpetuar o tirano. É a diferença entre luta como autoconstituição subjetiva (biopolítica) e luta como reprodução do poder, da desigualdade, dos privilégios (biopoder).

O fato concreto é que a passagem de ônibus aumentou para R$ 3,00, a mobilidade urbana ficou ainda mais distante, e os serviços públicos continuam péssimos. Isso confere uma base material palpável para a contestação, atraindo a simpatia e mesmo a adesão de várias pessoas ao redor, que frequentemente se juntam às passeatas ou catracaços. Tudo indica que os protestos vão continuar. Vão aprender com os erros e se requalificarem continuamente. Uma vez disparado um processo constituinte, ele tende a se diversificar e se enredar com os territórios da cidade e as redes já existentes de ativismo e produção de luta. Enquanto o país e a cidade enriquecerem os cofres, mas a partilha não se converter em direitos e melhorias, serão inócuas as tentativas de deslegitimar os protestos. E o grito “Não vai ter Copa” não se calará.

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