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Grécia: o cenário é de luta de classe

Por Juan Domingo Sánchez Estop, no Iohannes Maurus, 5/7/2015 | Trad. Bruno Cava, UniNômade

OXI3

Estamos ante um brutal cenário de luta de classe na Grécia. A coisa vai desde a sabotagem econômica em grande escala, com o fechamento forçado de bancos e a invalidação de cartões de crédito, até o terror social microfísico. Estamos ante um ambiente em que quem vem cortando brutalmente as aposentadorias e os salários diz abertamente que vai continuar a fazê-lo e ainda por cima acusa o governo grego de ser quem coloca em perigo os rendimentos dos cidadãos. Estamos ante um ambiente em que os grandes e pequenos patrões ameaçam te despedir se o “não” vence. Aqui, em Thasos, disseram a muita gente que trabalha no comércio, em postos de gasolina e noutros negócios que dependem do fornecimento contínuo de mercadorias que elas tirassem folga hoje e, se o “não” vencer, que não voltassem mais. Todos os capitalistas, dos maiores aos menores, estão em pé de guerra e exigem que se pague a dívida e se agrave a austeridade, para assim tornar o valor de mercado da força de trabalho ainda mais barato para eles próprios.

As grandes mídias mentem sem parar: dizem que amanhã não haverá mais nenhuma liquidez nos bancos, que a Grécia sairá do euro, da União Europeia e até do sistema solar. Dizem que haverá um corte em mais de 30% das contas de poupança com mais de 8.000 euros depositados, que não haverá nada nos supermercados, que amanhã não terá sequer pão, e que a Syriza quer instalar um regime latino-americano na Europa, quando na verdade os únicos que funcionam como uma oligarquia latino-americana antipática à democracia são os da troika interna e sua base social pitonisa: a burguesia vulgar, dependente e colonial. A direita grega, incluído aí o Partido Socialista (PASOK), agem como cobradores em nome de agiotas, ilegais e ilegítimos. São os vende-pátrias, como na Espanha ou Venezuela.

Apesar de tudo isso, a gente grega mantém o sangue frio. É o que mais chama a atenção. A concentração na Praça Syntagma anteontem foi histórica, colossal: um povo a defender um governo que se misturava com a multidão, com a gente. Varoufakis é o único ministro da economia na Europa que pode atravessar uma multidão recebendo mãos estendidas, beijos, abraços e palavras de encorajamento. Alexis Tsipras, entre a sua gente, a nossa gente, está como um peixe n´água. Há um grande orgulho neste povo, uma enorme dignidade. Ele merece ganhar das forças obscuras da chantagem e do poder oligárquico.

Aconteça o que acontecer, passada a alegria se o OXI (“não”) vencer, ou a tristeza se for o contrário, tudo será muito difícil amanhã para a maioria aqui. Será preciso seguir lutando na Grécia e no restante da Europa, porque se é verdade que o OXI salva o governo popular de Tsipras, amanhã os trabalhadores gregos seguirão tendo um governo, mas ainda sem o poder suficiente para mudar as coisas. Ter um governo é importante, se com isso é possível mudar muitas coisas e ir transformando as leis a nosso favor, mas a gente da Grécia não precisa ter lido Walter Benjamin para saber que, enquanto os oprimidos não liquidarem a sua condição de oprimidos, eles viverão num estado de exceção permanente, em que governos legítimos e leis importam quase nada diante da realidade da ditadura de classe, das classes capitalistas. É essa ditadura que precisamos tirar de cima de nós se realmente quisermos democracia e liberdade.

O OXI grego pode ser um passo importante, mas precisamos também ganhar noutros países da Europa. Rogo por isso a todos os meus amigos e companheiros de Podemos e a todas as forças de resistência que deixem de apostar em velhos caciques e partidos e deem a palavra à gente, a ela que nutre uma necessidade vital de vencer e sair deste maldito estado de exceção com a cabeça erguida, como pessoas livres e cidadãos dignos, como nossos irmãos e irmãs da Grécia.

 

 

Juan Carlos Sánchez Estop é ativista do Podemos espanhol e filósofo pela Universidade Complutense de Madrid.

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