Revista Lugar Comum nº45 – Chamada:
A Revista Lugar Comum: Estudos de mídia, cultura e democracia (ISSN/1415-8604) está selecionando artigos para seu próximo número, para a realização da sessão temática Resistências feministas na arte da vida, sob coordenação de Cíntia Guedes e Talita Tibola (artesefeminismos@gmail.com).
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Michelle Mattiuzzi, por André Moreira
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Resistências feministas na arte da vida
As lutas minoritárias passam por um momento de rearranjo em meio aos levantes globais contemporâneos. No Brasil, junho de 2013 se constitui como uma nova contingência, momento em que as ruas foram ocupadas por uma diversidade de pautas, e no qual uma série de chamados feministas ganham evidência em sua pluralidade, apontando novos desafios e perspectivas.
A expansão das pautas, reinvenção de coletivos e subjetividades criam um contexto singular brasileiro, que atualiza as questões sobre o modo de reconhecimento das resistências minoritárias, tal como coloca Judith Butler em entrevista a Suzana Milevska (2003): afinal, quem pode reivindicar como sua a(s) luta(s) feminista(s)? Em que situações, na arte e na vida, os feminismos atualizam suas táticas e termos?
Quando Paul B. Preciado afirma “Nós dizemos revolução”, preenche esse ‘nós’ de uma multiplicidade de femininos e devires que, diante da luta, precisa inventar para si outros modos de sentir, existir, viver: “Eles dizem representação. Nós dizemos experimentação. Eles dizem identidade. Nós dizemos multidão”. Com Preciado, atentamos a que o campo das práticas feministas, durante a segunda metade do século XIX, passa por uma ‘primeira ofensiva dos anormais’, ocorrida na França durante a constituição da Comuna. São os traços do que ele conceitualiza como “multidões queer”, termo que certamente pode ser reelaborado tomando outras cartografias como referência e que nos interessa explorar, uma vez que, felizmente, tais ofensivas não cessaram.
Certamente, encontrar a figura da mulher que resiste às opressões em representações coerentes, bem como identificar nas artes as temáticas que denunciam as posições de opressão, consistem em modos de aproximações críticas que, de forma legítima e necessária, sublinham os movimentos de resistência no contexto artístico; para este dossiê, nos interessam também aproximações pelas quais podemos perceber como a arte pode ser tratada não apenas como exemplo ou ilustração de uma prática militante que lhe seria anterior ou exterior. Entendemos que os feminismos não apenas orientam as práticas artísticas, mas transformam as relações institucionais e cotidianas instaurando assim novos problemas diante do questionamento das fronteiras entre vida e arte.
É a experiência partilhada no cotidiano das mulheres, nos seus diversos modos de ser mulher — pessoas não binárias, trans*, periféricas, negras, lésbicas, pornográficas, prostitutas, e nas diferenças de classe e raça que atravessam essas subjetividades – que coloca a questão do reconhecimento mútuo feminista. Os corpos diferentemente marcados sofrem todos a influência do capitalismo contemporâneo — na subdivisão do trabalho, na captura afetiva do trabalho –, e neste contexto, as formulações de um feminismo interseccional reaparecem, como possibilidade para pensar as solidariedades entre os distintos grupos de mulheres. Como apostar nessas solidariedades?
Como avançar o debate pelo campo das subjetividades para que possamos melhor tratar os agenciamentos micropolíticos? Como ampliar a luta feminista para além de modos já reconhecidos de exercê-la? A abordagem de autorxs como Judith Butler e Paul B. Preciado questionam as categorias de gênero, sexualidade e sujeito de luta a partir da dimensão das práticas, gestos e discursos que resistem às técnicas de controle e disciplina dos corpos. A partir dessa dimensão, torna-se possível desestabilizar as construções majoritárias de gênero/sexualidade/sujeito normal, implicadas no modelo de organização social atravessado pelo patriarcado, pela homofobia, pela transfobia e por outras manifestações de discriminação institucionalizadas. Como problematizar essas categorias sem cair no campo amorfo de um pós-modernismo sem sujeito? Ao mesmo tempo, como escapar do paradigma do sujeito, com suas armadilhas e fechamentos, para o da produção de subjetividade, de maneira a potenciar os agenciamentos, as interdependências, as interseccionalidades, e as singularidades?
De modo geral, convidamos à reflexão aquelxs que desejem debruçar-se sobre corpos, práticas, arranjos, gestos e intensidades que se enunciam de diversas maneiras, e que trabalham para atualização das lutas feministas.
Para esta edição, a Lugar Comum abre a chamada para artigos acadêmicos e também outros formatos de texto. São bem-vindos textos biográficos, ensaísticos, dentre outros. Para submissões, enviar os textos em formato word no e-mail artesefeminismos@gmail.com até 10 de setembro, seguindo as normas encontradas em: https://dev.integrame.com.br/encaminhamento-de-artigos/. Em caso de envio de imagens: resolução mínima de 300 dpis.
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Cíntia Guedes é doutoranda da ECO-Pós (UFRJ).
Talita Tibola, doutora em psicologia pela UFF, com concentração em Estudos da subjetividade, participa do grupo de pesquisa PesquisarCom e da rede UniNômade.