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Negri além de Negri

Por Giuseppe Cocco | Posfácio ao livro Marx além de Marx, de Antonio Negri (Autonomia Literária, 2016 [1979])

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imagem: “Zoroaster”,  de Nicholas K. Roerich (Rússia, 1936)

“O Operaísmo político dos vênetos foi isso: construção incansável de organizações de base e definição de uma linha vermelha de construção alternativa nas lutas e na sociedade”

Antonio Negri [1]

Odisseia

Tenho dois exemplares das edições italianas de Marx além de Marx. O primeiro é o original, publicado em maio de 1979 pela editora Giangiacomo Feltrinelli, de Milão, que logo esgotou e nunca mais foi reeditado [3]. O segundo é de 1998 (19 anos depois) e foi publicado pela editora Manifesto Libri, de Roma [4]. As duas edições contêm uma brevíssima “Premissa”:  uma nota de apresentação redigida pelo autor – datada “Milão, dezembro de 1978” – acompanhada de uma longa nota de advertência sobre as fontes bibliográficas. A “nova” edição traz também uma breve “Introdução” do autor, datada: “Roma, Prisão de Rebibbia, novembro de 1997”.

Ainda lembro de quando e onde comprei o exemplar original. Na folha de rosto, naquele momento, eu rascunhei: giugno 1979. Estava em Pádua, indo em alguma reunião na Rádio Sherwood ou na faculdade de Ciências Políticas e entrei na livraria da própria editora Feltrinelli (que na época estava em via San Franscesco, bem na frente do Palazzo del Bo, sede centenária da Universidade). Não é difícil explicar por que – quase quarenta anos depois – estão vivos na minha cabeça o momento e o contexto da compra desse livro do Negri: estávamos a apenas dois meses da grande operação repressiva que viria a acontecer em 7 de abril e que justamente ficaria conhecida como o Processo 7 aprile [5]. Com um grupo de intelectuais do movimento autônomo italiano, muitos deles seus colegas e meus professores da faculdade de Ciências Políticas de Pádua, Negri foi acusado de ser o chefe de “uma organização” que teria sido “a matriz e a direção das Brigadas Vermelhas (organização clandestina) e da Autonomia Operária (organização política), as duas visando a insurreição contra o Estado” [6]. Toda a imprensa, todos os partidos – sobretudo os de “esquerda”, o próprio Presidente da República da época (Sandro Pertini) o indicavam ao linchamento como o “inimigo público número 1”, um verdadeiro “monstro”: o cattivo maestro. Com ele, éramos todos sumariamente criminalizados e perseguidos. Encontrar um novo livro do “monstro” no meio daquele bombardeio opressor era como enxergar uma pequena luz, algo como um vagalume. Comprar o livro acabou se tornando um pequeno ato de resistência. Por isso lembro perfeitamente da sensação de alegria que me deu esse pequeno e silencioso evento.

Do alto dos meus 23 anos, tinha uma percepção ambivalente da virada repressiva na qual estávamos e que iria nos atropelar nos anos seguintes. Naquele momento, eu estava totalmente absorvido pelos esforços que fazíamos para mobilizar a nossa solidariedade aos presos e preencher o vazio que a onda repressiva tinha determinado. Um vácuo que seria sistematicamente ampliado por sucessivas ondas repressivas. Me sentia numa situação acima de minhas experiências e capacidades, mas totalmente obstinado em enfrentar a repressão, tentando manter abertos os espaços de autonomia e autovalorização. Visto a partir de Pádua e de toda a região do Vêneto, o movimento ainda me parecia capaz de mobilizar-se para desmontar os teoremas repressivos organizados por meio do apoio político da esquerda e do arsenal de “leis especiais” promulgadas ad hoc (uma dessas – a da “delação premiada” – teria um futuro promissor). Já tínhamos conseguido, nos últimos anos, emplacar grandes mobilizações contra a repressão, em particular depois das centenas de prisões que se seguiram à revolta de março de 1977, em Bolonha e Roma [7]. Contudo, eu tinha também a nítida percepção que a mobilização social em defesa dos presos estava aquém da resposta necessária, diante de um projeto repressivo que visava à criminalização do pensamento revolucionário e autônomo nascido daquela década mágica de lutas e conquistas [8]. Nessa fraqueza da mobilização, exercia um papel particularmente perverso a fuite en avant realizada pelo voluntarismo subjetivo, que a espiral repressiva só fazia aprofundar [9].

A mesma ambivalência havia então esse “encontro” com o mais novo livro do Negri, em que ele apresentava por extenso as aulas sobre os Grundrisse de Marx, oferecidas um ano antes na prestigiosa École Normale Supérieure (Rue D’Ulm – Paris). Na “premissa” (datada de dezembro de 1978), Negri agradecia ironicamente aos “aos estúpidos que, forçando-me a emigrar, terminaram obrigando-me a organizar as ideias com uma tranquilidade que, de outra forma, eu não teria condições de fazer.”. Por um lado, o breve período de emigração propiciou o contexto para a sistematização de sua potência teórica. Pelo outro, o exílio parisiense da primavera de 1978 seria apenas o prelúdio de uma longuíssima odisseia, feita de prisão, exílio e novamente prisão, uma viagem ao inferno que somente se resolveria 25 anos depois, em 2003.

Deleuze e Guattari escreveram que a “filosofia deve se tornar não-filosofia para que a não-filosofia se torne a terra e o povo da filosofia” [10]. Na ultimíssima página de seu livro dedicado à fenomenologia da percepção, Maurice Merleau-Ponty termina afirmando que “a filosofia se realiza destruindo-se como filosofia separada” e, de maneira ainda mais inusitada, continua: “mas, é aqui que é preciso se calar, pois somente o herói vive até o fim a sua relação aos homens e ao mundo” [11]. Ato contínuo, Merleau-Ponty passa a palavra à Antoine de Saint-Exupéry, em alguns trechos de seu Pilote de Guerre:  “O homem nada mais é que um elo de relações. Só as relações contam para o homem” [12]. O “herói” é mesmo aquele que vivencia essa ontologia relacional e perspectivista e é essa figura heroica da vivência, da Erlebnis [13] que encontramos nas obras de Negri e particularmente em Marx além de Marx. É arriscando a sua obra e até própria vida, lembram Gilles Deleuze e Félix Guattari, que a filosofia da imanência se faz: “Da imanência podemos estimar que ela é pedra angular ardente de toda filosofia, porque ela toma sobre si todos os perigos que esta tem que enfrentar, todas as condenações, perseguições e remanejamentos que ela sofre” [14].

Obviamente, o primeiro que ficaria incomodado com esse termo seria o próprio Negri. O heroísmo dele é claramente um anti-heroísmo, algo bem próximo do que Claude Lefort encontra em Edgar Quinet: não uma “evasão no imaginário suscitada pela ascensão dos homens de letras e a atração da teoria”, mas o que de repente permite de separar-se da tradição, de ter “fé no impossível”, ou seja, o “sinal de uma situação que não deixa outra escolha que a aceitação da servidão ou a invenção da liberdade” [15]. Um herói das margens, das danças dionisíacas que “nascem – dizia Hélio Oiticica – do ritmo interior do coletivo”. “Seja herói, seja marginal”. A condição das margens é constituição do “ato total do ser” experimentado diretamente, sem mediações: “não atos parciais totais, mas um ‘ato total de vida’, irreversível, o desequilíbrio para o equilíbrio do ser” [16]. A margem é a terceira margem do rio, aquela da outra história – potente e resistente – dos pobres, dos trabalhadores, dos deserdados, dos escravos que no deserto constituem um outro povo e uma outra terra.

No deserto da prisão e do exílio, Negri resiste e persiste. O seu sofrimento é um grito que se transforma em alegria, no diálogo potentíssimo com outros “marginais”, com outros filósofos “malditos”, outros “cattivi maestri”: como a figura bíblica de Jó, aquela do filósofo excomungado Baruch Espinosa e enfim a do poeta romântico Giacomo Leopardi. É assim que Negri atravessa o (primeiro) período de prisão e transmuta o valor do sofrimento: “Comecei a escrever Jó, a força do escravo nos anos já distantes de 1981 ou 1982. Cumpria o meu quarto anos de prisão. Naquele momento escrevia também sobre Leopardi. Dedicava-me sempre, portanto, à reflexão sobre o sofrimento[17]. No prefácio à segunda edição italiana do livro dedicado ao poeta corcunda (Leopardi), Negri explicita: o que o interessou no poeta italiano foi entrever nele a “figura de resistente à derrota da revolução e um defensor da ética das Luzes, de um poeta que de toda maneira reivindicava um animo heroico diante da crise” [18]. Com Leopardi, a figura do herói do qual estamos falando se confirma e define ainda mais: o herói é o marginal e esse é o pobre, o pobre capaz de riqueza, porque transmuta todos os valores: “Pobre é quem sempre está do lado dos pobres: pobre é qualquer pessoa que está imediatamente disponível a lutar por verdade e justiça” [19].

Também lembro onde e quando vi pela primeira vez a nova edição italiana de Marx além de Marx: foi o próprio Negri que ma mostrou, no apartamento de Trastevere, em Roma, onde transcorria o seu “regime prisional semiaberto” (sendo que devia voltar todas as noites para dormir na prisão de Rebibbia, localizada na periferia, aonde a sua companheira o levava). Ele tinha acabado de passar mais dois ou três anos de prisão em regime fechado desde que, em 1997, havia decidido interromper os 14 anos de exílio parisiense para voltar à Itália, numa tentativa de acelerar uma medida de anistia que nunca acontecerá. A essa altura, devia ser 2001 ou 2002 e tínhamos começado a falar do projeto de um livro sobre a América Latina (projeto que realizaríamos em 2005 [20]) e ele me mostrou com um ar divertido vários exemplares de livros escritos em ideogramas e publicados no Japão e na Coreia do Sul. Um deles era Marx além de Marx.

Então, o outro exemplar não é uma segunda edição, mas uma “nova” edição, pois a editora que inicialmente publicou quase todos os livros de Negri, a Feltrinelli [21], tinha muito simplesmente – com base no lobby de intelectuais ligados à esquerda – “jogado fora” as provas de praticamente todos seus livros que, em consequência, estavam todos esgotados e desaparecidos [22]. Como o próprio Negri explica na introdução à nova edição italiana, Marx além de Marx (inicialmente publicado e várias vezes reeditado também na França e nos Estados Unidos) não teve o mesmo tratamento que os outros livros de sua autoria (nesse caso, a editora não destruiu as provas), mas era introvabile (não mais encontrável). Quase 20 anos depois, em 1998, o livro seria novamente publicado, e Negri estava novamente na prisão.

Desde 7 de abril de 1979, a Itália continuava sendo um enigma: por um lado, ela foi o berço de uma renovação filosófica enraizada nas práticas de um formidável ciclo de lutas autônomas que haviam começado a murmurar  em Turim, com a revolta dos operários FIAT (já em 1962), se generalizaram nas lutas estudantis de março e maio de 1968 e no Autunno Caldo (Outono Quente) de 1969 da revolta operária contra o trabalho, para depois alastrar-se ao longo de toda a década de 1970, até o movimento de 1977; pelo outro lado, o deserto social, político e moral produzido pela repressão política – entre 1979 e 1982 –  ainda não encontrou o êxodo capaz de atravessá-lo e deslocá-lo. A consequência é que para uma boa parte da chamada “opinião pública”, Negri continua sendo um cattivo maestro.

Sem apreendermos o tamanho desse “enigma” e dessa miséria italiana, dificilmente nos aproximaremos da sensação de estar diante do tremendo desafio que Negri experimentou ao longo dessa Odisseia. Resistir, persistir, conseguir continuar pensando e produzindo – inclusive dentro do sofrimento da prisão (e do exílio) para, enfim, “voltar” à Itália passando pelo “mundo”. Deleuze e Guattari falavam do “Ulysses, o plebeu astucioso, (…) Proletário autóctone ou Migrante estrangeiro que se lançam no movimento infinito – a revolução” [23]. Voltar à Itália, mas não sem antes ter provincializado a península: “Na Itália, nesse paesucolo às margens do Império, esses comportamentos editoriais se acompanharam da tentativa de reduzir ao silêncio uma geração” [24].  O antropólogo Eduardo Viveiros de Castro costuma desconstruir a retórica nacionalista brasileira invertendo os pontos de vista: “O Brasil é grande, mas o mundo é pequeno”. Negri também desconstrói a pressão repressiva e a censura italianas operando uma troca de trocas de pontos de vista: “Infelizmente para eles, repressores e editores, o mundo era maior”. Mas o ponto de vista que alcança o mundo “maior” é aquele que vem pelas margens das linhas de fuga do êxodo, dos corpos aprisionados, pois “até desde a cadeia foi possível fazer ouvir uma voz inteligente contra a imbecilidade e o cinismo reinantes” [25].  É na prisão desde onde a “alegria teórica” derrota todas as “paixões tristes” e faz triunfar o cérebro [26].

A prisão onde Negri e os seus companheiros se encontram é uma prisão dura. Falando de Luciano Ferrari Bravo, Negri lembra que ele passou cinco anos e meio de prisão e mais dois anos de residência obrigatória antes de “ser absolvido”. Foram “cinco anos e meio nas piores prisões de segurança máxima de toda Itália: desde Treviso à Rebibbia, desde Favignana a Palmi, de Trani à Venezia, para, finalmente, de novo, nas seções especiais de Rebibbia”. Negri lembra que “em Favignana ele viveu seis meses nas grutas de tufo que a indignação pública fez fechar nos anos 1980. Na de Trani, Luciano esteve no meio do motim e esteve à beira da morte” [27]. O prefácio à primeira edição do livro sobre Espinosa é datado 7 de abril de 1979 – abril de 1980, nas prisões por onde o regime o fez circular num ritmo demencial: “Rovigo, Rebibbia, Fossombrone, Palmi, Trani” [28]. Por quatro anos, Negri compartilhou com Luciano e os outros o mesmo inferno. Lembro de quando lhe perguntei como se saiu durante a revolta (e a repressão) no cárcere de Trani [29] e ele me contou a intervenção das tropas especiais que tocaram o terror, colocaram todos os detentos deitados no chão das celas descarregando os fuzis e metralhadoras a apenas alguns centímetros acima das cabeças, do corredor polonês pelo qual todos tiveram de passar na hora de sair do edifício para ir dormir vários dias no pátio da prisão, ao relento, pois era dezembro, pleno inverno europeu. Lembro que ele me contou das horas que passou a medicar os companheiros, pois era o único que podia usar as mãos: diferentemente do que a maioria que as tinha usado para proteger a cabeça, ele as havia usado para evitar que quebrassem os óculos. Enquanto os outros tinham a cabeça e as mãos massacradas pelas coronhadas de fuzil, Negri tinha apanhado apenas na cabeça [30]. O franciscanismo de Antonio Negri não é uma figura retórica, mas a Erlebnis de sua filosofia prática, de sua abolição da filosofia como saber separado, como história de uma disciplina do pensamento. Apesar da “condenação durar muito tempo, sobretudo porque a exclusão que sofreu, da vida, da pátria, da igreja, da razão, foi em seguida santificada na história da filosofia (…) os cattivi maestri, escreve Negri, ressurgem sempre, a verdade e o estilo de vida deles se impõem”.

Em fevereiro de 1946, Merleau-Ponty escrevia que – desde que a “paz” voltou – “os heróis se afastaram”. Contudo, ele afirmava que “o culto dos heróis é eterno” [31] e ao mesmo tempo passou por uma mudança, se tornou materialista: ao passo que os “santos do cristianismo, os heróis das revoluções passadas (…) tentavam crer que sua luta já estava ganha no céu ou na História, (o)s homens de hoje não dispõem desse recurso. O herói contemporâneo não é Lúcifer, tampouco Prometeu, é o homem [32]. O que permite ao “herói sacrificar-se não é, como em Nietzsche, o culto pela morte ou, como em Hegel, a certeza de realizar o que a história quer, mas a fidelidade ao movimento natural que nos joga em direção às coisas e aos homens. O que amo, dizia Saint-Exupéry, não é a morte, mas a vida” [33]. O herói é Ulysses. Ele luta contra a morte: “O que é belo, lembra o helenista Jean-Pierre Vernant numa reflexão filosófica dedicada ao período em que participava da resistência na Segunda Guerra Mundial, é estar vivo” [34]. Pensando na morte de Luciano, o seu amigo de faculdade e de prisão, Negri lembra: “Oferecer um galo a Esculápio – como Sócrates pediu na hora de morrer – é um ‘hino à vida’, uma medicina que pode nos salvar, a metamorfose que pode nos transformar em anjos” [35]. Comentando essa mesma enigmática frase de Sócrates, Michel Foucault disse em seu último curso que é “um convite ao cuidado de si e dos outros” [36].

De qual herói precisamos hoje? Desta vez os cattivi maestri têm que se tornar multidão: “Ninguém nunca tentou se confrontar com uma multidão de homens livres e iguais, capazes de amores fortes. Nós precisamos tentar. Essa multidão de cattivi maestri é a carne do mundo que vem, é o acesso a uma idade de monstros” [37]. O trabalho dos monstros é o terreno da produção de subjetividade, das sublimes desproporções e excessos, cujos poderes criativos não podem ser contidos nos estreitos limites da racionalidade moderna. A antimodernidade precisa se aliar à outra modernidade [38].

A ressurreição dos corpos

Marx além de Marx é um livro sobre a crise da lei do valor, isto é, a crise da medida. A teoria do valor, escreve Negri, “é usada como um porrete contra de nós”. A lei do valor é a arquitrave do objetivismo marxista e da ortodoxia construída dentro dessa igreja. “Nada nos interessa da ortodoxia. Pelo contrário, se pudéssemos seguir sem Marx, seriamos felizes”. Nenhuma fé pode explicar, portanto, a volta a Marx. O que interessa são as potentes antecipações que os Grundrisse contêm. Nesses cadernos, Marx aparece como o “teórico das grandes transformações do capital no nível da crise da lei do valor” [39]. De maneira ainda mais enfática, Negri escreve: “(…) a crise da lei do valor (é) o ápice da investigação marxiana” [40].  Nos Grundrisse, se procura uma obra política, onde “a luta de classe (e) a política são enfim o centro da teoria econômica” [41]. Por isso, Marx começa pela circulação: “Se a teoria da mais-valia introduz na teoria econômica o fato da exploração, a teoria marxiana da circulação introduz (na economia) a luta entre as classes” [42].

Mas, uma boa maneira para apreender o que é Marx além de Marx talvez seja ler uma passagem do prefácio escrito por Negri para o seu livro sobre Jó, em que ele enfatiza a sua percepção sobre o que é a crise. O ponto de partida é – mais uma vez – a Erlebnis: “a situação na qual me encontrava era realmente desesperadora”. Sem perspectivas de sair, “buscava na análise do sofrimento uma chave para resistir” [43].  Ao mesmo tempo, a vivência da incomensurabilidade da dor e do sofrimento da prisão renovava e ampliava a percepção negriana da crise da medida. É dessa percepção que vem a sua maturidade teórica em Marx além de Marx. Falar de crise da medida implica, com efeito, entrar “em contradição imediata com (a) cultura marxista”, exatamente porque ela consiste em “(…) um trabalho da medida (e) uma paixão medida pela razão de Estado”, seja no direito do trabalho interior à mediação reformista, seja na mensuração totalitária do trabalho no socialismo real.

A crise é consequência da insurreição contra a medida: “Foi em 1968 que percebi, maravilhado, que uma grande mudança da fortuna do homem e seu destino era possível e poderia, em conseguência, abalar toda medida do mundo” [44]. Ao longo das décadas de 1970, essa percepção se tornou cada vez mais aguda, diante e dentro do formidável ciclo de lutas libertárias que a Itália conheceu. Negri diz que, mais tarde, ele chegou a se perguntar se essa percepção tão aguda da crise da medida — e das leis que a estruturam — não foi capaz de abalar a minha própria razão, ao ponto de levar-me – eu e alguns amigos – ao enfrentamento revolucionário contra o Estado” [45]. Também me pergunto se, em junho de 2014, a minha percepção da crise da medida da governabilidade brasileira (em particular, o esgotamento definitivo do dispositivo de regulação constituído pelo PT e o chamado “lulismo”) não foi tão aguda a ponto de abalar a minha razão até o ponto de querer que o Negri – que estava visitando o Brasil – se dobrasse às dimensões estreitas de uma antecipação que – apesar de totalmente adequada – ele não podia ou sequer queria compartilhar, não naquele momento.

Naquele outro momento, no final da década de 1970, em Marx além de Marx, Negri nos oferece as bases teóricas sistemáticas de uma percepção da crise da “lei do valor” que eram tremendamente urgentes e ao mesmo tempo cheias de antecipações que iriam se concretizar – pelo menos em termos políticos – somente bem mais tarde. O que queremos dizer com isso? Que nos anos 1970 a “crise da medida” anunciada pela insurreição estudantil de 1968, pelo outono quente operário de 1969, praticada pelo sem número de coletivos e “assembleias autônomas” da constelação que compunha a Autonomia Operária, era mais um terreno – potentíssimo – de “crítica” do que uma “crise” da medida. O método marxiano da tendência, que tão bem Negri apresenta [46], talvez tenha nos feito esquecer as ambiguidades do processo de extenuação da “lei do valor”. Não apenas porque ela era substituída pelo “valor da Lei”, mas também pelos efeitos paradoxais que o próprio aprofundamento da crise determinava em contrapartida [47].

Por um lado, a passagem da “produção de mercadorias por meio de comando” (do regime disciplinar) para a produção de “comando por meio de comando” (a sociedade de controle) se tornava tautológica e cada vez mais débil. Por outro lado, esse processo produzia efeitos de segmentação e fragmentação da composição social do trabalho, que ofereciam uma sobrevida – paradoxal, mas não menos efetiva – à medida. O que foi afirmado através dos milhares de trabalhadores demitidos, dos milhares de militantes presos e exilados, dos séculos de prisão e das dezenas de jovens que morreram nas manifestações de rua ou se engajando em ações armadas [48]. A produção de comando por meio de comando encontrou nos temas da segurança e da governamentalidade promovidos pelos neoliberais um horizonte político novo, alimentado e legitimado pelos fragmentos residuais do “velho”. Não por acaso, a “esquerda” — em particular o Partido Comunista Italiano — desempenhou um papel direto na repressão e na prisão de Negri. A própria noção de “sociedade de controle”, proposta mais tarde por Gilles Deleuze, indicava um deslocamento mais aberto e mais ambíguo do que pensávamos e, sobretudo, do que aparece nos dois livrinhos lançados por Negri antes (em 1976) e depois do movimento de 1977 (em 1978) [49].

A crise da medida é resultado e condição do novo horizonte de uma crítica já totalmente emancipada do objetivismo da ortodoxia marxista e de sua íntima cumplicidade com o stalinismo — e, pois, com o próprio capitalismo. Ao mesmo tempo, o stalinismo soube se adaptar ao neoliberalismo mais do que a queda dos muros pareceu dizer. Na defesa da medida, capitalismo liberal e stalinismo capitalista estão juntos. São as duas faces de um mesmo objetivismo positivista que tem suas bases nos valores (únicos) da Razão. O próprio reformismo oportunista aparece como uma variável desse stalinismo. A ruptura com o socialismo precisa ser muito mais contundente e muito mais definitiva e, por isso, nunca podemos esquecer a questão central da crítica da técnica.

O terreno dessa renovação da crítica precisa passar antes de mais nada pela questão da tecnologia e da racionalidade. A tecnologia antes de ser técnica é social — como escreveu Deleuze em seu livro sobre Foucault, citando, aliás, como referência o operaísmo italiano. Em meados da década de 1960, Tronti escrevia: “A ciência e a técnica não serão o prêmio da luta de classes, mas o seu terreno” [50]. Em um comentário sobre o Anti-Édipo, Félix Guattari não dizia outra coisa: “O que nós denunciamos são todos os temas da oposição homem-máquina, do homem alienado pelas maquinarias…” [51]. A técnica não é nem o objetivo já dado de uma linha de progresso que seria suficiente alcançar e seguir, nem algo que seria preciso recusar a fim de proteger uma natureza natural e seus selvagens. A técnica e a ciência são o terreno da luta.

Maurice Merleau-Ponty definia a perda de sentido da racionalidade instrumental como um movimento pelo qual “a ciência manipula as coisas e renuncia a habitá-las (e assim) trata do ser como objeto em geral” [52]. No período industrial, a bússola se constituía – dizia Marx – através da classe operária. Mas o socialismo real acabou amputando a perspectiva marxiana: o operariado transformado em Estado pelo Partido de vanguarda acabou, por sua vez, se tornando o sujeito para um continuísmo das mesmas racionalidades e produtivismos industriais, de tipo capitalista, e até mesmo algo pior (como a história da industrialização forçada da União Soviética nos mostrou, ao produzir trabalho forçado en masse, uma nova escravidão).

Os fundadores do operaísmo italiano da década de 1960 geraram outra execução virtuosa – um novo virtuosismo – da partitura marxiana, quando escreveram, alguns anos antes da insurreição estudantil e operária de 1968, que a análise das “necessidades de desenvolvimento do capital” só interessa para “transformá-las em possibilidades subversivas de classe”. Isso significava dizer que a classe operária pode transformar tudo porque “é inimiga até de si própria, enquanto capital” [53].  A centralidade que Marx atribuía à classe operária era a de ser um sujeito capaz, no grau em que lutasse por seus interesses, de uma transformação dos valores. Tal transformação se dá por meio de uma transformação antropológica, que levaria à sua própria destruição como trabalho assalariado. A luta não é pelo emprego, mas contra o trabalho. Ou seja, nas palavras de Antonio Negri: a crítica de Marx ao mais-valor é um “dispositivo que reverte a acumulação e a alienação por ela produzidas” em luta pela liberdade [54].

Assim, o Marx que Negri persegue é o que está além do objetivismo determinista, do oportunismo e do stalinismo. O reformismo oportunista, no lugar de protestar contra a insensatez do desenvolvimento capitalista e contra a infelicidade individual que ele determina, apenas se mobiliza – de maneira moralista e “progressista” — contra “um desenvolvimento histórico inacabado, constrangido” [55]. É nessa miséria política que a esquerda nos países que lidam com o subdesenvolvimento, como no caso da América Latina e, particularmente, do Brasil, acaba encalhando, inclusive as experiências dos chamados governos “progressistas” da primeira década de 2000. Para essa “esquerda” oportunista, a emancipação dependeria da manutenção do projeto da modernidade e de seu trabalho assalariado de tipo industrial. Aqui, a perspectiva é aquela da dialética histórica e suas inevitáveis sínteses: o desenvolvimento, os seus estágios e “transições” (socialistas e/ou desenvolvimentistas). Não por acaso, nesse terreno, encontramos uma sociologia “marxista” do trabalho convertida em liturgia comemorativa, que associa o culto pelas tábuas da “lei do valor” à retórica do trabalho como valor (transcendente).

Negri procura em Marx a antecipação, mas também antecipa a si próprio, a sua trajetória. Ao mesmo tempo que ele redigia “seus cadernos sobre os cadernos de Marx” — no calor empolgante dos eventos semi-insurrecionais na Itália que vão de fevereiro a setembro de 1977 — ele escrevia um outro livrinho destinado à ação política (e que será largamente usado pelo estado como peça de acusação contra ele): “Il domínio e il sabotaggio: sul metodo marxista della trasformazione sociale[56]. Há uma relação estreita entre os dois textos. Um e outro são desdobramentos recíprocos de teoria e práxis. Nele, podemos ler: “Marx – dizia Louis Althusser – pensa o comunismo como uma tendência da sociedade capitalista” [57]. O método é também “constituinte” e isso “na medida em que a luta de classe é constituinte de antagonismos explosivos (…)”. Eis detalhados seus níveis sucessivos: “Abstração determinada, métodos da tendência, nova exposição e deslocamento do campo da investigação: este dinamismo metódico (que) constitui um universo ‘plural’ dentro do qual mover-se é arriscado, compreender duro e vencer empolgante” [58].

No meio de páginas arrebatadas pela exaltação da luta, encontramos antecipações potentíssimas para o debate político e teórico de nosso tempo, nestes meados da década de 2010, momento em que estamos vivenciando o desmoronamento vergonhoso da ilusão positivista e neodesenvolvimentista da esquerda sul-americana e o esgotamento de seus governos, entregues a crises econômicas e morais que nos lembram a miséria do socialismo real. “A compatibilidade entre interesse particular operário e interesse geral da sociedade, entre socialismo e democracia – a compatibilidade, pois, entre o processo de autovalorização e a estruturação produtiva da sociedade, não passa de um mito. Não Proudhon e Bentham, mas Rousseau e Stálin são os pais desta bem-amada síntese”. Como não lembrar das justificativas dos governos do PT para remover as moradias dos pobres na preparação dos megaeventos: em nome do interesse geral (Rousseau) e por meio da polícia (stalinista).

É aqui que encontramos uma incrível antecipação dos paradoxos que nos apresenta o cinismo oportunista da esquerda positivista, em suas cruzadas contra o “pós-moderno” e contra o próprio debate que ele incita. “Pessoalmente, diz Negri, não tenho nada a ver com os chamados ‘nouveaux philosophes’, mas devo dizer que fico pasmo quando vejo representantes históricos da classe operária que sempre foram ciosos do binômio esclarecimento-stalinismo produtivo, insultar os jovens filósofos por terem registrados essa conexão mistificadora” [59].  É exatamente o que podemos ler na pobre literatura dos intelectuais da esquerda brasileira dessa segunda década do século XXI: critica-se o “pós-moderno” (e o neoliberalismo) para, por um lado, defender as políticas autoritárias de megaobras, megaeventos e subsídios para a grande indústria e, pelo outro, para terminar convocando os próprios neoliberais para aplicar violentos ajustes ante os desequilíbrios macroeconômicos que as suas próprias ilusões instrumentais desenvolvimentistas criaram.

É preciso não apenas aceitar a crise da lei do valor, mas afirmar a sua determinação operária, para buscar a constituição de antagonismos desmedidos. Por isso, é pelo conceito de “autovalorização” que Negri vai buscar apreender a crise: “A autovalorização proletária é força de se separar do valor de troca e capacidade de fundar-se no valor de uso, (no) reconhecimento das dimensões independentes das forças produtivas” [60].  Trata-se, pois, do terreno de uma luta operária contra o trabalho — nunca por ele — o que transforma todos os valores e por meio do que a classe operária abole a si própria enquanto: ela se metamorfoseia. Naquele final da década de 1970, Negri apreende o movimento de 1977, as suas dimensões totalmente sociais e internas à esfera da circulação (por isso a ênfase colocada no movimento feminista em vários de seus textos, pois se trata de uma luta que assume incontornáveis características biopolíticas), ponto de vista subjetivo que lhe permite radicalizar a análise da tendência. Nesse terreno, é enfim possível romper concretamente com as ambiguidades dialéticas de Marx e, sobretudo, do marxismo como um todo, em particular da trágica experiência do socialismo real e do stalinismo. Se Lênin podia pensar as relações entre “sovietes e eletrificação”, entre “sovietes e locomotivas”, hoje o capital “jogou a locomotiva contra nós” [61], exatamente como Stálin atropelou os trabalhadores com o trabalho forçado massificado pelo sistema penal, ou como os governos neodesenvolvimentistas na América do Sul — e no Brasil em particular — deram continuidade aos grandes projetos da ditadura militar atropelando os índios e as suas reservas, removendo os pobres de suas favelas e massacrando os jovens por meio do sistema mafioso de governo das periferias.

Aqui, o conceito unitário de desenvolvimento capitalista se rompe. De um lado, o desenvolvimento do capital constante, do outro o das forças produtivas. Negri encontra ou produz um “outro” Marx em dois movimentos. Em primeiro lugar, um Marx teórico da formação da subjetividade. Depois, um Marx que antecipa a passagem da subsunção formal para a subsunção real. Não mais, pois, o Marx teórico do determinismo objetivo do capital, mas aquele do perspectivismo renovado pelos jovens teóricos do operaismo italiano (Raniero Panzieri e Mario Tronti). Não mais o Marx que apreende o mundo a partir unicamente da esfera da produção – aceitando dessa maneira a subordinação da sociedade à ordem fabril – mas que começa os seus cadernos pela circulação socializada. Não há teoria do comunismo que não seja uma teoria da formação do sujeito ao mesmo tempo que a circulação do capital é seu devir. E esse devir é também o movimento de socialização do capital, de construção de uma sociedade-fábrica. Tudo isso se abre a mais dois desdobramentos teóricos. O primeiro diz respeito à necessidade de uma nítida ruptura com a lógica da dialética, de suas sínteses e teleologias, que tudo pretende resolver. O segundo implica apreender a passagem para a subsunção real do ponto de vista das transformações do trabalho. O processo constitutivo do sujeito afirma-se como separação que se opõe à dialética. Na separação, o dualismo do conceito é ultrapassado pelo terreno da dualidade dos sujeitos: “o processo de constituição da independência de classe é hoje (em 1977) processo de separação”. Ou seja, as lutas proletárias já estão num terreno de ruptura com a dialética do capital [62]. Nas lutas operárias, Negri enxergava a afirmação “sectária (de nossa) condição separada, (e) a diversidade da constituição (proletária) ” [63]. Na radicalização anticapitalista, há uma radicalização da crítica do stalinismo e do socialismo como formas do capital. Aqueles que, do ponto de vista do marxismo tradicional, criticam a perspectiva da separação e da alteridade na realidade, “assumem a responsabilidade de participar da monstruosidade do desenvolvimento do ‘socialismo’ e de seus ilícitos negócios com os mais nojentos aspectos do modo de produção capitalista”[64].

Contudo, é no terreno das transformações do trabalho que “Negri estava além de Negri”. A percepção da crise da medida estava além da dinâmica sociológica real ou pelo menos das inércias corporativas e políticas da velha esquerda e dos sindicatos. A transformação da força-de-trabalho em força-invenção, no ritmo da recusa do trabalho assalariado e no horizonte da transmutação do trabalho estava, assim, constituindo o terreno de lutas de tipo biopolítico – como indicava o movimento feminista e como tinha feito, antes, o movimento dos negros norte-americanos (com lutas que aconteciam diretamente na esfera da reprodução, envolvendo todo o tempo de vida). Isso se deva com muito mais elementos de fragmentação e descontinuidade do que pensávamos conseguir enfrentar à época. Se a desmedida capitalista não tinha a capacidade de impor uma nova métrica, ela conseguiu pelo menos impedir que o desdobramento das lutas a reinventasse noutros termos, como dizia Negria: “comunistas”[65] — ou, como diríamos hoje, nos termos da “constituição do comum”. Talvez, um dos problemas tenha sido mesmo o fato que nossa violenta crítica da cumplicidade que ligava o reformismo e o stalinismo, o socialismo e o capitalismo, se mantivesse ainda demasiadamente interna ao campo da “esquerda” e, nesse sentido, se deixasse atravessar por um viés ideológico. O que realmente interessava, ao contrário, talvez fosse mesmo ter largado todas as amarras ideológicas, fugir rumo ao deserto e radicalizar a invenção operaista no terreno biopolítico da recomposição de trabalho manual e trabalho intelectual no corpo vivo do trabalhador “social”.

Era preciso ir além do operaismo, inclusive na análise do americanismo e do New Deal. A síntese proposta por Tronti em 1970 [66] e a sua subsequente retomada dos temas da autonomia do político podem ser explicados por elementos internos, por uma ambiguidade funcionalista interna à abordagem operaísta. A noção de “era progressista” que fazia das lutas operárias o mecanismo fundamental de regulação do crescimento capitalista era viável na medida que a luta era vista fundamentalmente como luta dos operários. Sim, a luta era o determinante da passagem da exploração extensiva (o mais valor absoluto) para a exploração intensiva (o mais valor relativo, que a inovação técnica proporcionava). Mas essa dimensão primeira, constituinte, não deixava de encontrar uma síntese somente na forma do desenvolvimento: reformista ou socialista que fosse.

Por isso, Negri tinha que ir além de Tronti, recusando a autonomia do político e afirmando o critério da “separação”. Negri ia além de Negri ao desdobrar a autonomia operária em termos de autovalorização diante de um capital que não mais organizava a cooperação social produtiva, não mais podia fazê-lo, mas apenas a comandava desde fora, de maneira cada vez mais parasitária. Isso precisava não apenas sulcar a análise da tendência, mas também as bases de um novo operaismo: “Somente a história das lutas pode fazer a do equivalente geral” [67]. Mas essa história das lutas também precisa ser radicalmente “outra” com relação ao capital. A essa altura, a constituição da subjetividade e a lógica da separação já estavam em funcionamento por fora da relação salarial.  Há uma longa duração das lutas biopolíticas.

Talvez consigamos encontrar algo noutro autor “maldito” daquelas décadas. Tão “maldito” que nem sequer o movimento italiano da autonomia tinha entendido a potência de sua reflexão trágica. Pier Paolo Pasolini, em 1966, fazia descobertas muito próximas dos operaistas sobre as dimensões operárias do fordismo rooseveltiano. “Na América há ideólogos não marxistas que entenderam os limites do socialismo real, ou seja, entenderam que os operários soviéticos são dominados por uma burocracia que de revolucionário só tem o nome”. A democracia estadunidense é “extremista”, dizia ele, “exasperada, quase mística e enquanto tal é revolucionária”. Pasolini tinha também a sensibilidade para entender o que ia além disso, além do operaismo (da análise operaísta), algo como uma biopolítica: “Quem não viu uma manifestação pacifista e não-violenta em Nova Iorque está em falta de uma grande experiência humana” [68]. São páginas belíssimas, onde ele compara aos membros da resistência antifascista na segunda guerra os estudantes brancos do Norte que descem no Sul para lutar contra a segregação racial juntos aos negros. “A extraordinária novidade (para um europeu como eu, diz Pasolini), é que a consciência de classe (…) paira nos americanos em situações totalmente novas e quase escandalosas para o marxismo” e isso porque “o americano totalmente livre teve que passar pelo calvário dos negros e compartilhá-lo” [69]. Pasolini vê, justamente nos Estados Unidos, um tipo de resistência que já está além das lutas operárias, exatamente nos termos que dizia um conto da Black Resistance: “Temos que jogar nosso corpo na luta”. A luta e o corpo coincidem no movimento antirracista norte-americano e o poeta via nisso “o novo mote de um engajamento real e não tediosamente moralista: jogar o  corpo na luta”  [70].

Voltemos ao que Negri apreende nos Grundrisse, ou seja, a passagem da teoria do mais-valor para o da circulação: “A teoria do mais-valor (…) é a definição da possibilidade do sujeito revolucionário, a sua definição em negativo. Com a teoria da circulação a realidade do sujeito coletivo de classe vem colocando-se (…)”. Isso significa que o “sujeito se torna cada vez mais verdadeiro, mais concreto, a estrutura celular que a teoria do mais-valor descreve se torna corpo, realidade animal acabada”[71].

A constituição do sujeito e a sua dimensão separada (ou seja, não mais mediada dentro da linha do progresso) têm como terreno o trabalho vivo que se “apropriou da ferramenta, a tornou sua por meio da rede e do êxodo, sob a forma da prótese” [72]. É entre a rede e o êxodo, na ressurreição dos corpos, que hoje se define essa condição prévia, sem a qual não pode haver produção nenhuma. Entre as redes e as ruas acontece um novo tipo de trabalho, cuja cooperação é colaborativa e tendencialmente horizontal. Esse “entre” pode ser definido como o comum, um comum sem o qual nenhuma produção é possível: sujeitos que produzem o comum em comum.

Para terminar, lembraremos que o próprio Negri nos adverte: sequer os cattivi maestri estão livres de manipulação e de serem usados pelo avesso da radicalidade democrática que teorizaram e praticaram ao risco de suas vidas. Num livrinho polêmico dedicado ao debate italiano na virada do século, ele escrevia: “O pensamento fraco traduziu para o italiano um Foucault e um Deleuze travestidos em soubrettes, e assim os fizeram dançar no caderno cultural dos jornais da chamada esquerda (…)” [73]. Todo autor, toda obra passa pelo desafio de um reconhecimento que na realidade significa ao mesmo tempo ir para um museu, por exemplo, aquele da História da Filosofia. Hélio Oiticica escreveu que “museu é o mundo”, mas o mundo foi para o Museu juntamente com a sua obra. O Museu transforma “as obras que nasceram no calor de uma vontade (…) em prodígios de um outro mundo” – dizia Merleau-Ponty. Assim, o reconhecimento “mata a veemência da pintura como a Biblioteca transforma em mensagens os escritos que eram gestos de um homem…”[74]. Da mesma maneira, a história da filosofia santifica a exclusão dos cattivi maestri, pois a “história da filosofia é – lembra Negri – uma faculdade jurídica, ou seja, de polícia” [75]. No mesmo tom, Gilles Deleuze e Félix Guattari escreviam que a “filosofia é devir, não história: ela é coexistência de planos e não sucessão de sistemas [76]”.

Por definição, na filosofia dos cattivi maestri não há e nem pode haver dogma e menos ainda qualquer sombra de doxa. Assim, lembra Negri, esse pensamento gera “discípulos”, mas o faz de maneira ambígua: “pois que ele não disciplina essa geração, ele terá discípulos fieis e infiéis”. Isso significa relativizar até esse pensamento da imanência e da democracia absoluta? Pelo contrário: “sempre há uma solução prática dos problemas reais”. Somente na prática o pensamento resolve a sua própria ambiguidade, “mergulhando no evento de seu aparecimento” [77]. Esse é um desafio sempre atual, mesmo quando até os cattivi maestri estão cansados.

 

Rio de Janeiro, julho de 2015

 

Giuseppe Cocco é professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e é autor, entre outros, de GLOBAL – Biopoder e luta em uma América Latina globalizada (Record, 2005), escrito em conjunto com Antonio Negri, e MundoBraz; o devir-mundo do Brasil e o devir-Brasil do mundo (Record, 2009), italiano de origem, participou ativamente da luta autônoma italiana nos anos 1970.

NOTAS

[1] Luciano Ferrari Bravo. Ritratto di un cattivo maestro. Con alcuni cenni sulla sua epoca. Manifesto libri, Roma, 2003, p. 43.

[3] Antonio Negri, Marx oltre Marx. Quaderno di lavoro sui Grudrisse, Feltrinelli, Milão, 1979.

[4] Antonio Negri, Marx oltre Marx, manifestolibri, Roma, 1998 (reimpressão novembro de 2003).

[5] Existe uma vasta literatura sobre o Processo 7 aprile. Carlo Ginzburg fala desse caso num artigo sobre as relações entre historiadores e juízes, na reflexão sobre o método indiciário. “Provas e possibilidades”, in A Micro-História e outros ensaios, Difel, Lisboa, 1989, p.182. Sobre a produção teórico-política do operaismo italiano das décadas de 1960 e 1970 e a repressão organizada com a acusação de “insurreição” contra o estado, podemos citar dois livros. O primeiro é o livro póstumo de Luciano Ferrari Bravo, Dal fordismo alla globalizzazione. Cristalli di tempo politico, prefazione di Sergio Bologna, ManifestoLibri, Roma, 2001. Trata-se de uma coleção de vários textos do professor Luciano Ferrari Bravo, um dos docentes presos em 7 de abril pelo procurador Pietro Calogero. Luciano passou cinco anos em prisão preventiva (1979 – 1985) e faleceu precocemente, em 2000. A segunda parte”do livro é composta por textos escritos ao jornal diário Repubblica, com a transcrição do seu interrogatório ao juiz Palombarini durante o processo e, por último, por uma reflexão (”Riflessioni su un fantasma”) escrita na prisão de Trani, em 1980, sobre o insolúvel problema jurídico colocado pelo crime de “insurreição”, tipo penal ao redor do que foi montada a operação repressiva. O segundo livro em homenagem ao amigo, teórico e companheiro foi escrito pelo próprio Negri: Luciano Ferrari Bravo. Ritratto di un cativo maestro, Cit. Seu prefácio tem um título emblemático: “Apologia del cattivo maestro”.

[6] Antonio Negri, Luciano Ferrari Bravo. Ritratto di un cativo maestro. Con alcuni cenni sulla sua época. Manifesto Libri, Roma. 2003, p. 79. Grifos meus.

[7] Cabe lembrar o grande encontro internacional contra a repressão que aconteceu em setembro de 1977 em Bolonha. Ver http://www.infoaut.org/index.php/blog/storia-di-classe/item/2694-23-settembre-1977-il-convegno-a-bologna-contro-la-repressione .

[8] Sobre o período revolucionário de 1968-1977 na Itália, ver Nanni Balestrini e Primo Moroni (a cura di), L’Orda d’oro. 1968-1977: la grande ondata rivoluzionaria e creativa, politica ed esistenziale. SugarCo, Milano, 1988.

[9] O auge do voluntarismo vanguardista, recheado de formas de autoritarismo stalinista, aconteceu em março de 1978. Um ano depois do grande movimento de março de 1977 e um antes do 7 de abril, quando as Brigadas Vermelhas sequestraram e assassinaram Aldo Moro, o dirigente mor do partido católico, Democrazia Cristiana, que governava o país desde o segundo pós-guerra e um dos arquitetos do “compromisso histórico” firmado com o Partido Comunista Italiano.

[10] Gilles Deleuze e Félixa Guattari, Qu’est-ce que la philosophie?, Minuit, Paris, 1991, p. 105. Tradução nossa.

[11] Phénoménologie de la perception (1945), Gallimard, Paris, 2012, p.521. Grifos nossos.

[12] Antoine de Saint-Exupéry, Pilote de guerre, Gallimard, Paris, 1942, p.99 e p. 171.

[13] Sobre a experiência vivida, ver Maurice Merleau-Ponty, “Les sciences de l’homme et la phénoménologie”, Parcours deux, 1951-1961, Verdier, Lagrasse, 2000, pp. 66-68 e 115. Merleau-Ponty usa Husserl e Dilthey para falar de uma filosofia totalmente situada, que “é a cada momento uma tomada de consciência do que há de válido ou seguro no momento considerado nos resultados científicos adquiridos (…) ”.

[14] Gilles Deleuze e Félix Guattari, Qu’est-ce que la philosophie?,  cit., p.47.

[15] Claude Lefort, “Révolution et Parodie” (1985), Le temps present. Écrits 1945 – 2005, Belin, Paris, 2007, p.542.

[16] Hélio Oiticica, “A dança na minha experiência – 12 de novembro de 1965”, in Museu é o mundo, organização de César Oiticica, Rio de Janeiro, 2011, pp.75-6.

[17] Antonio Negri, “Prefácio à nova edição”, Jó, a força do escravo, Record, Rio de Janeiro, 2007, p. 7. (a primeira edição italiana saiu em 1990 com o título: Il lavoro di Giobbe. Il famoso testo biblico come parabola del lavoro umano, SugarCo de Milão). O livro é dedicado “Aos poucos que não são arrependidos. Às novas gerações”. Sempre nesse período de prisão, escreverá o já clássico livro sobre Espinosa:  Anomalia Selvaggia. Saggio su Potere e Potenza in Baruch Espinosa, Feltrinelli, Milão, 1982.

[18] “Prefazione alla seconda edizione”, in A. Negri, Lenta ginestra. Saggio su Leopardi, Quaderni di Mellepiani, Mimesis Eterotopia, Milano, 2001, p. 7. Grifos nossos.

[19] Luciano Ferrari Bravo. Ritratto di un cattivo maestro, cit., p. 149.

[20] Antonio Negri e Giuseppe Cocco, GlobAL. Biopoder e lutas em uma América Latina Globalizada, Record, Rio de Janeiro, 2005.

[21] Editora fundada por Giangiacomo Feltrinelli, um militante da esquerda revolucionária que tinha usado a fortuna familiar para um projeto editorial muito próximo dos movimentos oriundos do 1968. Feltrinelli morreu tragicamente num acidente, durante uma operação de guerrilha, na periferia de Milão, em 1972.

[22] Os cinco livros que a editora Feltrinelli destruiu foram publicados em 2006 numa coletânea chamada I libri del rogo, pela editora romana Derive e Approdi.

[23] Qu’est-ce que la philosophie, cit., p. 94.

[24] Antonio Negri, “Introduzione alla nuova edizione” (datada novembro de 1997, Roma, prisão de Rebibbia), in A. Negri, Marx oltre Marx, Manifesto libri, cit., p.10. Grifos nossos.

[25] “Corpo imprigionato” é o título do capitulo 3 do livro escrito in memoriam do amigo e professor Luciano Ferrari Bravo, Ritratto di un cattivo maestro, cit., p.79, Grifo nosso.

[26] Antonio Negri, “Introduzione alla nuova edizione”, cit., p. 10.

[27] Ritratto di un cattivo maestro, cit., p.79.

[28] L’anomalia selvaggia. Saggio su potere e Potenza in Baruch Espinosa, Feltrinelli, Milão, 1981, p.19.

[29] A revolta no cárcere de Trani, em dezembro de 1980, foi fomentada e organizada pelos militantes presos das Brigadas Vermelhas (onde aliás os brigadistas rossi, num “belo” estilo estalinista, o ameaçavam de morte por ele resistir, com toda a sua inteligência e até de dentro da cadeia, à lógica da espiral da militarização do movimento).

[30] Este é o relato de Gabriella Gazzea Vesce, esposa de Emilio Vesce – um dos presos do 7 aprile  que estava com Negri e Ferrari Bravo e outros na prisão de Trani e também falecido prematuramente – publicado por Il Mattino di Padova, numa carta  do 10 de maio de 2008, onde ela ainda exige que se publique a verdade. Ou seja que Negri, Vesce, Ferrari Bravo e os outros do 7 de abril foram injustamente acusados também da revolta e depois absolvidos: “Gli imputati del 7 aprile, Toni, Emilio, Luciano, e altri erano stati chiusi assieme ai 19 secondini, furono pestati tutti, con il calcio dei fucili. Quando chiesero l’identità di ciascuno con il mitra ficcato in bocca, individuarono le guardie «ferite» e chiamarono i soccorsi. I detenuti furono spinti a calci e fatti passare tra due file di «incappucciati» con manganelli. A Emilio, «uno dei capi», toccò due volte il percorso. Naso e costole fratturate. Arrivò il mandato di cattura per la rivolta, per il sequestro delle guardie e del giudice D’Urso. Dopo l’interrogatorio, nulla, prosciolti ovviamente, senza alcuna informazione sui media. I radicali entrati nel carcere ricevettero da Emilio, Luciano, Toni e altri un comunicato stampa di dissociazione dalla rivolta, che procurò loro ulteriori tensioni, per usare un eufemismo, con i brigatisti. Dopo 5 anni, 5 mesi, 5 giorni di carcere preventivo, tre mesi di confino Emilio Vesce e Luciano Ferrari Bravo furono assolti. Padova deve far piena luce sulla malagiustizia e disinformazione riguardo il processo 7 aprile. Domani cade il settimo anniversario della morte di Emilio e credo sia corretto rendergli giustizia.”. Il ruolo di Emilio Vesce nella rivolta di Trani”. Disponível em http://ricerca.gelocal.it/mattinopadova/archivio/mattinodipadova/2008/05/10/MC6PO_MC603.html.

[31] Maurice Merleau-Ponty, publicado inicialmente com o título “O culto do heroi”, Action, n. 74, pp. 12-13. Republicado como último capítulo de Sens et non-sens, Gallimard, Paris, 1966, p. 221.

[32] Ibid., p. 226. Grifos nossos.

[33] Cit., p. 225.

[34] La Traversée des frontières, Seuil, 2004, Paris, p.101.

[35] A. Negri, Luciano Ferrari Bravo .., cit., p. 147.

[36] “Leçon du 15 février 1984”, Le Courage de la vérité. Le gouvernement de soi et des autres II, Cours au Collège de France. 1984, Hautes Études, Gallimard, Seuil, Paris, 2009, p. 105.

[37] A. Negri, Luciano Ferrari Bravo .., cit., p. 15

[38] Sobre a poética monstruosa da resistência do proletariado metropolitano, ver o desdobramento do conceito de monstro, a partir  do disforme vivo, em Bárbara Szaniecki, Outros Monstros Possíveis, Disforme contemporâneo e design encarnado, Anna Blume, São Paulo, 2014, p. 234.

[39] Antonio Negri, Marx oltre Marx, cit., p. 29.

[40] Ibid., cit., p. 25.

[41] Ibid., p. 142.

[42] Ibid.

[43] A. Negri, Jó, …, cit., p. 7.

[44] Ibid.

[45] Ibid., p.9. Grifos nossos.

[46] Na “Lição 3: O método da tendência antagonista”.

[47] Em Il dominio e il sabotaggio, Antonio Negri dizia: “a crise da lei (do valor) não elimina sua vigência, mas modifica sua forma (…) transformando-a de lei da economia política em forma do comando do Estado”. Isto é, a “Lei do Valor” é substituída pelo “Valor da Lei”. Feltrinelli, Milano, 1978, p.13.

[48] Sem contar as duas centenas de pessoas inocentes massacradas por bombas do “Estado” – numa estratégia de tensão totalmente parecida ao que o Brasil conheceu com o atentado do Rio Centro – ou pela violência dos grupos neofascistas.

[49] Estamos falando de Proletari e Stato, Feltrinelli, Milão, 1976 e de Il Dominio e il sabotaggio, cit.

[50] Mario Tronti, “La linea di condotta” (1966) tradução para português de Portugal de Carlos Aboim de Brito e Manuel Villaverde Cabral, in Mario Tronti, Operários e Capital, Afrontamento, Porto, 1976..

[51] Gilles Deleuze et Félix Guattari, “Entretien sur l’Anti-Oedipe”, in L’Arc, cit., p. 32.

[52] L’oeil et l’esprit, (1964) Gallimard/Folio, 2001, Paris, pp. 9-10.

[53] Mario Tronti, “Linha de Conduta” (1966), in Operários e Capital, cit. p. 8. Grifos nossos.

[54] Antonio Negri, D’òu venons-nous? – L’origine, site Uninomade 2.0, 13 de julho de 2011 (conferência pronunciada em 20ème Le Monde, 16 de novembro de 2008), http://uninomade.org/da-dove-veniamo-lorigine/.

[55] A. Negri, “Prefazione alla prima edizione”, Lenta Ginestra, cit., p.15.

[56] Feltrinelli, Milão, 1978. Publicado em janeiro de 1978, o livrinho contem uma breve nota de apresentação datada de setembro de 1977 que o apresenta como quinto capitulo de uma série que inclui Crisi dello Stato-piano, comunismo e organizzazione rivoluzionaria (Feltrinelli, Milão, 1974), “Partito operaio contro il lavoro” (in S. Bologna, P. Carpignano, A. Negri, Crisi e organizzazione operaia, Feltrinelli, Milão, 1974), Proletari e Stato, (Feltrinelli, Milão, 1976) e “Autovalorizzazione operaia e ipotesi di lavoro” (in A. Negri, La forma Stato, Feltrinelli, Milão, 1977). O conjunto desses livros teve as provas destruídas pela editor Feltrinelli e serão publicados em 2006 sob o título geral de Libri del Rogo, em português: “os livros da fogueira” (cit, ver acima).

[57] “Le marxisme comme théorie <<finie>>” (1978) in Louis Althusser, Solitude de Machiavel. Édition préparée et commentée par Yves Sintomer, PUF-Actuel Marx, Paris 1998, p. 285, grifos do autor. Sobre o método marxista, vide também Antonio Negri, 5 Lições sobre Império, DP&A, Rio de Janeiro, 2003.

[58] Marx oltre Marx, cit., p. 25. Grifos do autor.

[59] Il dominio e il sabotaggio, cit. Pp. 21-2.

[60] Il dominio e il sabotaggio, Feltrinelli, Milano, 1978, p.19.

[61] Il dominio e il sabotaggio, cit. p. 49.

[62] Essas lutas eram definidas por Negri e pelo movimento da Autonomia Operária como lutas de “autovalorização”, ou seja, lutas que articulavam a recusa do trabalho subordinado de tipo fabril com formas de cooperação social produtiva oriunda de fora das fábricas, da cidade como usina produtiva.

[63] Antonio Negri, Il dominio e il sabotaggio, Feltrinelli, Milano, 1978, p.16.

[64] Ibid.

[65] II dominio …, cit. p. 58.

[66] No artigo “The Progressiva Era”, datado de 1970 e usado como conclusão na coletânea de artigos de Mario Tronti, Operai e capitale, Einaudi, Torino, 1971. Uma virada para o horizonte da “autonomia do político”, que cria um grau de separação para a esfera da política, é criticada — não por caso — por Negri num dos três apêndices de seu primeiro livro sobre Espinosa, L’Anomalia Selvaggia (cit.), “Note sulla storia del político in Tronti”, pp.288-292. Nela,podemos ler: “No fundo, a coisa que mais se parece ao poder, ao político, é o dinheiro. Vocês podem imaginar então uma história do dinheiro – e de seu autônomo funcionamento – que não tenha em si uma história das relações de produção, das proporções da reprodução, da dinâmica das forças produtivas? Quando é que a estrutura do Tesouro poderia explicar o funcionamento do dinheiro?”.

[67] Antonio Negri, “Note sulla storia del politico in Tronti”, L’Anomalia Selvaggia, cit., p.291.

[68] Pier Paolo Pasolini, Empirismo Eretico, cit., pp. 144-5.

[69] Ibid., pp. 148-9.

[70] Ibid., p. 150. Grifos nossos.

[71] A. Negri, Marx oltre Marx, cit., p. 116.

[72] A. Negri, “Lettre à Raúl sur le corps”, Art et Multitude, Stock, Paris, p. 109.

[73] La differenza italiana, Nottetempo, , Roma, 2005, pp.7-8.

[74] La prose du monde, Gallimard (Tel), Paris, 1969, p.103.

[75] Luciano Ferrari Bravo … , cit., p. 10.

[76] Qu’est-ce que la philosophie, cit.p. 59.

[77] Luciano Ferrari Bravo …, cit., p. 14.

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