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OcupaRio

“Museu é o mundo, é a experiência cotidiana”.  Helio Oticica

 

A atmosfera está diferente de ontem e de anteontem?

 

A cidade está ocupada. Corpos. Afetos. Ações. Gestos. Parangolés. Macumba. Afoxé. Uma multiplicidade infinita de possibilidades transita em uma cidade em processo. Uma manifestação de desejos antes muda ganha voz.

Ocupa-Rio faz parte de um movimento global que se organiza e se constrói através de outras formas de pensar e se relacionar com o mundo. Um acontecimento político preenchido de novas peculiaridades.

 

As palavras de ordem se transformam em ações, discussões e questionamentos. Do micro ao macro, do particular ao totalizante, do vizinho ao estranho. Emerge a capacidade de se manter junto, de agenciar, pouco a pouco, os fluxos de certezas e desejos. O inimigo não é mais localizado. As divisões de classes ganham novas formas de organizações, mais fluídas e diluídas nas relações de poder.

 

É neste contexto que brota uma nova forma de resistência e luta. Passam a existir encontros e discussões, tanto globais como locais, que criam um estado de duração e não apenas de trânsito pela cidade. Algo dura e se diferencia de um imediatismo-megaevento.Surge uma dinâmica que pretende pensar e se relacionar com a rua e seus atravessamentos com todas as suas dificuldades e potencialidades dentro do risco,produzindo algo novo.

 

Questões aparecem quando a rua vira um território-politico-afetivo de propagação, circulação de ideias e ação. A ocupação faz do espaço publico algo comum e produtivo. Ao invés de optar por uma lista de demanda, opta-se por fazer da própria ocupação sua principal demanda, com um exercício cotidiano de democracia direta que aponta novos caminhos de ação. Sem intermediários e sem a capitalização das relações. As assembleias se dissolvem no processo de construção de novas formas de organização. Ao invés de buscar um consenso, opta-se por arriscar nas relações espontâneas e intensivas, que se organizam pelas bordas, não mais pelo centro. Dentro desta proposta se produz afetos, discursos,sensibilidades,relações e engajamentos.

 

As organizações tradicionais como os sindicatos e a grande indústria mediáticase sentem desconfortáveis, muitas vezes, com um movimento tão desenraizado que procura no acontecimento algo que não está dado. Uma outra forma de vida. Não se trata de um marcha nem de um comício, mas de uma ocupação, de um devir- carnaval que ironiza aquilo que se torna crônico e rígido e politiza o carnaval.

 

Algo insiste em se manifestar e desterritoralizar-se.O movimento é nômade e virtual, se revela no acontecimento. Organiza-se de forma horizontal, em rede, sem representação, sem lucro e sem partido. A rede é pulverizada e não aponta para uma única luta, mas sinaliza os movimentos e pontos frágeis da cidade-mundo. Trata de um espaço em atividade para pensar e agir frente às questões atuais relacionadas ao direito à moradia, pelo direito à cidade,pelos limites de conceito de gênero,aos povos quilombolas,as questões indígenas, os ambulantes, os camelôs, as relações de vulnerabilidade dos moradores de rua e todos aqueles que não são televisionados. A proposta é criar um território comum onde o corpo ativo seja a principal ferramenta de luta.

 

Não se trata de fazer política levantando uma bandeira ou procurando uma causa para fortalecer o movimento. Trata-se de fazer política das minorias. Daqueles que entendem a política como experimentação e exercício de sobrevivência,perseguindo uma over-vida Diferente do que está constituído; o dualismo de classe, de sexo e a reprodução da subordinação de uma minoria. Novas formas de existir são produzidas: os‘’mil sexos’’, as mil cores, as mil funções, as mil classes. Uma variação infinita que não permita definições.

 

O Ocupa-Rio-Cinelândia-Méier lança-se em direção à minorizacão. Os precários, os artistas de rua, os pobres, os loucos, os sem-teto, os sem-terra, os sem-dignidade ,os sem-presente e sem-futuro,sem-‘’produção’’ e os sem-visibilidade.Enfim, os sujeitos excluídos da historia que recusam a subordinação do poder.Essas forças compõem o movimento.Uma vez que não se trata de criar reivindicações objetivas para legitimar ou credibilizar a ocupação perante a uma cobrança externas.As bandeiras viraram corpos vivos e híbridos dispostos a se misturar e prontos para agir,as reivindicações se multiplicam a cada acontecimento.

 

O movimento global foi devorado em terras tropicais e ganhou um ritmo próprio. Permanece vivo e ativo em deslocamento na direção da Zona norte. O Ocupa-Méier realizado no dia 12 Maio em frequência com uma mobilização global. A experiência carioca de ocupação se alimentou de outro território com novas estórias, culturas, arquiteturas, cheiros, barulhos e sobrevive organicamente, criando espaços de ação comum, dialogandocom o entorno e fazendoconvergir forças para continuar o movimento. ’’Contra todos os importadores de consciência enlatada. O movimento quer voltar a devorar os valores colonizados e centrifuga-los’’. Oswald de Andrade

 

Depois de 42 dias ocupando a praça da Cinelândia(no Centro da cidade do Rio),no dia 12M, O Ocupa-Rio foi ao Méier (na periferia Zona norte)interpelado por um ponto de vista local da Praça Agripino Grieco, região movimentada do bairro.No primeiro momento, parecia uma aventura esbarrar com o Outro;o outro bairro;o outro do trem e o outro do Baixo Méier.Já em um segundo momento,esses olhares tímidos e desconfiados entram em cena de forma espontânea,criando um elo de convergência múltipla que passa a fazer parte domovimento.

 

O palco-rua vira um arena catalisadora de skatistas, dançarinos de hip-hop, grupo de teatro Nise da Silveira declamando poesias, passantes curiosos que se sentam na praça para participar do Bingo, atividade realizada dentro do Ocupa-Rio que tem como prêmio ‘’pedaços’’da cidade maravilhosa e a performance do movimento Anarco-Funk que se misturam com cheiro do McDonald’s,o barulho interrupto dos bares do Baixo Méier,os apressados à espera no ponto de ônibus,as senhoritas comportadas da feirinha ao lado,os muitos comerciantes alertas das redondezas.

 

É neste cenário que emerge um novo fluxo descodificado, um tanto diferente e distante dos costumes habituais, que reinventam desta relação o espaço-tempo e experimentam uma nova forma de dançar junto ao som de varias musicas. É desta mistura de corpos e afetos que surge essa grande miscelânea.O exercício político surge desta linguagem diluída no cotidiano que sutilmente é capaz de mudar todas as coroas de lugar.

 

Nestes fluxos particulares 12M-Cinelândia-Méier, o Ocupa-Rio traça novos caminhos e novas direções. O movimento respira novos ares e bebe em novas fontes para continuar à caminhar em estradas ainda não percorridos e em caminhos à desbravar.Restou a sensação da alegria deste encontro que gerou inundações de pulsões em direção a uma nova musica que mesmo cessando de tocar,os corpos ainda querem dançar.

 

Hoje o movimento continua se organizado em acampadas permanentes em praças publicas e também de formas mais intensivas e transitória-sem perder a preocupação e o cuidado com as particularidades do território ocupado. Um exercício constante do comum que expande as reflexões e discussões para além das “salas” de jantar. A rua vira um palco de produção e criação de novas formas de subjetividade. A resistência não se dá de forma unilateral, nem negativista ou reativa, e sim afirmando um modo de ser que coloca o corpo-ativismo em movimento. Afinal, como diz Oswald de Andrade: ‘’nunca fomos catequizados. Fizemos foi o Carnaval. O índio vestido de senador do Império. ’’

 

Outros personagens estão no palco. Os corpos vivos trazem à tona um novo modo de vida que foge do padrão:homem brancos assalariado e espectador. O movimento está interessado em produzir desvios. Esgotaram as possibilidades de vida dentro da lógica da vida-capital. É preciso voltar a sonhar e organizar o nosso tempo para uma nova revolução. A próxima parada está por vir…

 

OcupaRio

Por Gabriela Serfaty

“Museu é o mundo, é a experiência cotidiana”.  Helio Oticica

A atmosfera está diferente de ontem e de anteontem?

A cidade está ocupada. Corpos. Afetos. Ações. Gestos. Parangolés. Macumba. Afoxé. Uma multiplicidade infinita de possibilidades transita em uma cidade em processo. Uma manifestação de desejos antes muda ganha voz.

Ocupa-Rio faz parte de um movimento global que se organiza e se constrói através de outras formas de pensar e se relacionar com o mundo. Um acontecimento político preenchido de novas peculiaridades.

As palavras de ordem se transformam em ações, discussões e questionamentos. Do micro ao macro, do particular ao totalizante, do vizinho ao estranho. Emerge a capacidade de se manter junto, de agenciar, pouco a pouco, os fluxos de certezas e desejos. O inimigo não é mais localizado. As divisões de classes ganham novas formas de organizações, mais fluídas e diluídas nas relações de poder.

É neste contexto que brota uma nova forma de resistência e luta. Passam a existir encontros e discussões, tanto globais como locais, que criam um estado de duração e não apenas de trânsito pela cidade. Algo dura e se diferencia de um imediatismo-megaevento.Surge uma dinâmica que pretende pensar e se relacionar com a rua e seus atravessamentos com todas as suas dificuldades e potencialidades dentro do risco,produzindo algo novo.

Questões aparecem quando a rua vira um território-politico-afetivo de propagação, circulação de ideias e ação. A ocupação faz do espaço publico algo comum e produtivo. Ao invés de optar por uma lista de demanda, opta-se por fazer da própria ocupação sua principal demanda, com um exercício cotidiano de democracia direta que aponta novos caminhos de ação. Sem intermediários e sem a capitalização das relações. As assembleias se dissolvem no processo de construção de novas formas de organização. Ao invés de buscar um consenso, opta-se por arriscar nas relações espontâneas e intensivas, que se organizam pelas bordas, não mais pelo centro. Dentro desta proposta se produz afetos, discursos,sensibilidades,relações e engajamentos.

As organizações tradicionais como os sindicatos e a grande indústria mediáticase sentem desconfortáveis, muitas vezes, com um movimento tão desenraizado que procura no acontecimento algo que não está dado. Uma outra forma de vida. Não se trata de um marcha nem de um comício, mas de uma ocupação, de um devir- carnaval que ironiza aquilo que se torna crônico e rígido e politiza o carnaval.

Algo insiste em se manifestar e desterritoralizar-se.O movimento é nômade e virtual, se revela no acontecimento. Organiza-se de forma horizontal, em rede, sem representação, sem lucro e sem partido. A rede é pulverizada e não aponta para uma única luta, mas sinaliza os movimentos e pontos frágeis da cidade-mundo. Trata de um espaço em atividade para pensar e agir frente às questões atuais relacionadas ao direito à moradia, pelo direito à cidade,pelos limites de conceito de gênero,aos povos quilombolas,as questões indígenas, os ambulantes, os camelôs, as relações de vulnerabilidade dos moradores de rua e todos aqueles que não são televisionados. A proposta é criar um território comum onde o corpo ativo seja a principal ferramenta de luta.

Não se trata de fazer política levantando uma bandeira ou procurando uma causa para fortalecer o movimento. Trata-se de fazer política das minorias. Daqueles que entendem a política como experimentação e exercício de sobrevivência,perseguindo uma over-vida Diferente do que está constituído; o dualismo de classe, de sexo e a reprodução da subordinação de uma minoria. Novas formas de existir são produzidas: os‘’mil sexos’’, as mil cores, as mil funções, as mil classes. Uma variação infinita que não permita definições.

O Ocupa-Rio-Cinelândia-Méier lança-se em direção à minorizacão. Os precários, os artistas de rua, os pobres, os loucos, os sem-teto, os sem-terra, os sem-dignidade ,os sem-presente e sem-futuro,sem-‘’produção’’ e os sem-visibilidade.Enfim, os sujeitos excluídos da historia que recusam a subordinação do poder.Essas forças compõem o movimento.Uma vez que não se trata de criar reivindicações objetivas para legitimar ou credibilizar a ocupação perante a uma cobrança externas.As bandeiras viraram corpos vivos e híbridos dispostos a se misturar e prontos para agir,as reivindicações se multiplicam a cada acontecimento.

O movimento global foi devorado em terras tropicais e ganhou um ritmo próprio. Permanece vivo e ativo em deslocamento na direção da Zona norte. O Ocupa-Méier realizado no dia 12 Maio em frequência com uma mobilização global. A experiência carioca de ocupação se alimentou de outro território com novas estórias, culturas, arquiteturas, cheiros, barulhos e sobrevive organicamente, criando espaços de ação comum, dialogandocom o entorno e fazendoconvergir forças para continuar o movimento. ’’Contra todos os importadores de consciência enlatada. O movimento quer voltar a devorar os valores colonizados e centrifuga-los’’. Oswald de Andrade

Depois de 42 dias ocupando a praça da Cinelândia(no Centro da cidade do Rio),no dia 12M, O Ocupa-Rio foi ao Méier (na periferia Zona norte)interpelado por um ponto de vista local da Praça Agripino Grieco, região movimentada do bairro.No primeiro momento, parecia uma aventura esbarrar com o Outro;o outro bairro;o outro do trem e o outro do Baixo Méier.Já em um segundo momento,esses olhares tímidos e desconfiados entram em cena de forma espontânea,criando um elo de convergência múltipla que passa a fazer parte domovimento.

O palco-rua vira um arena catalisadora de skatistas, dançarinos de hip-hop, grupo de teatro Nise da Silveira declamando poesias, passantes curiosos que se sentam na praça para participar do Bingo, atividade realizada dentro do Ocupa-Rio que tem como prêmio ‘’pedaços’’da cidade maravilhosa e a performance do movimento Anarco-Funk que se misturam com cheiro do McDonald’s,o barulho interrupto dos bares do Baixo Méier,os apressados à espera no ponto de ônibus,as senhoritas comportadas da feirinha ao lado,os muitos comerciantes alertas das redondezas.

É neste cenário que emerge um novo fluxo descodificado, um tanto diferente e distante dos costumes habituais, que reinventam desta relação o espaço-tempo e experimentam uma nova forma de dançar junto ao som de varias musicas. É desta mistura de corpos e afetos que surge essa grande miscelânea.O exercício político surge desta linguagem diluída no cotidiano que sutilmente é capaz de mudar todas as coroas de lugar.

Nestes fluxos particulares 12M-Cinelândia-Méier, o Ocupa-Rio traça novos caminhos e novas direções. O movimento respira novos ares e bebe em novas fontes para continuar à caminhar em estradas ainda não percorridos e em caminhos à desbravar.Restou a sensação da alegria deste encontro que gerou inundações de pulsões em direção a uma nova musica que mesmo cessando de tocar,os corpos ainda querem dançar.

Hoje o movimento continua se organizado em acampadas permanentes em praças publicas e também de formas mais intensivas e transitória-sem perder a preocupação e o cuidado com as particularidades do território ocupado. Um exercício constante do comum que expande as reflexões e discussões para além das “salas” de jantar. A rua vira um palco de produção e criação de novas formas de subjetividade. A resistência não se dá de forma unilateral, nem negativista ou reativa, e sim afirmando um modo de ser que coloca o corpo-ativismo em movimento. Afinal, como diz Oswald de Andrade: ‘’nunca fomos catequizados. Fizemos foi o Carnaval. O índio vestido de senador do Império. ’’

Outros personagens estão no palco. Os corpos vivos trazem à tona um novo modo de vida que foge do padrão:homem brancos assalariado e espectador. O movimento está interessado em produzir desvios. Esgotaram as possibilidades de vida dentro da lógica da vida-capital. É preciso voltar a sonhar e organizar o nosso tempo para uma nova revolução. A próxima parada está por vir…

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