Por Jonathan Watts, no Guardian, em 7/2/14 | Trad. Aukai Leisner
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Depois dos protestos de rua, invasões de estação e do catracaço, o movimento pelo transporte público no Rio de Janeiro finalmente conseguiu o que almejava, por algumas horas, nesta noite de quinta-feira, com a tomada das principais centrais de ônibus e trem da cidade.
Milhares de passageiros caminharam por terminais de embarque destruídos na estação Central do Brasil, em meio a um violento confronto provocado pelo aumento das tarifas, com disparos, prisões e a paralisação das redes de transporte.
A estação, no centro do Rio, ecoava as bombas de efeito moral da polícia e as batucadas celebratórias, em ritmo de samba, dos manifestantes, à medida que tomavam controle da primeira fileira das máquinas de tarifa.
Quase mil pessoas juntaram-se à marcha do Passe Livre, desencadeada pelo anúncio do prefeito da cidade, Eduardo Paes, que as tarifas de ônibus vão subir de R$ 2,75 para R$ 3,00 no próximo sábado[8/2].
Pode parecer barato, quando comparado a Londres ou Nova Iorque. Mas para o passageiro diário que ganha um salário mínimo de R$ 724,00 por mês, isso significa uma despesa com transporte equivalente a mais de um sexto de sua renda.
Os aumentos das tarifas de ônibus foram o gatilho para protestos massivos que se estenderam a dezenas de outras questões e levaram mais de um milhão de pessoas às ruas de 80 cidades brasileiras em junho de 2013. Os aumentos foram então postergados, mas agora voltaram a figurar na agenda política.
Embora o protesto de quinta-feira tenha sido bastante menor que o do ano passado, foi mais concentrado e a tática dos organizadores parece ter pegado boa parte da polícia de surpresa.
Após caminhar pacificamente a partir região da Candelária , dezenas de ativistas do grupo Black Block sairam em disparada e adentraram a estação antes que a polícia pudesse fechar os portões. Eles quebraram catracas, sacudiram bandeiras e incitaram os passageiros a embarcar nos trens sem pagar.
O batalhão de choque e a segurança da estação voltaram a ganhar território com spray de pimenta e bombas de efeito moral, mas após um breve intervalo os manifestantes retomaram o controle do saguão e se puseram a cantar, batucar e dançar enquanto os passageiros – muitos cobrindo os rostos com lenços para se proteger do gás lançado pela polícia no terminal – entravam sem pagar.
“Eu apoio totalmente esse protesto”, disse Fabiana Aragon, uma trabalhadora da saúde, com o rosto vermelho e os olhos marejados, que estava voltando para casa depois do trabalho. A mulher de 43 anos disse que havia gasto quase um terço de seu salário de R$1.000,00 com tarifas de transporte e ainda tinha que enfrentar longas horas de espera, trens sujos, e vagões lotados sem ar-condicionado. ” A situação agora é absurda”.
Os enfrentamentos se espalharam para as ruas, do lado de fora da estação. Meia dúzia de incêndios queimavam no bairro vizinho da Luz Vermelha. Bombeiros foram chamados para apagar uma chama que reduziu uma cabine de bilhetes a cinzas. Centenas de passageiros em pânico debandaram através da estação de ônibus principal, depois da polícia ter lançado bombas de efeito moral, apesar de não haver sinais visíveis de manifestantes. Dois jovens negros mascarados gritavam enquanto eram presos, algemados e postos dentro do veículo blindado da polícia.
Os participantes dos protestos disseram que haveria mais manifestações a caminho até a Copa do Mundo, que começa em 12 de junho.
“O transporte público é vagaroso, sujo, abafado e caro. O governo não deveria falar em aumento de passagens, e sim trabalhar para melhorar os serviços”, disse Thayna, uma estudante de 21 anos. ” Quando vier a Copa, haverá mais protestos. A Copa do Mundo está aprofundando as desigualdades”.
Resta saber, no entanto, se o movimento poderá retornar à escala das manifestações de junho de 2013.