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Chamada para textos sobre manifestações

Premissa

O movimento de junho continua aberto. Uma nova subjetividade política emergiu nas ruas em 2013, uma subjetividade antagonista a um projeto de desenvolvimento, cuja partilha de bens e direitos não chega à maioria da população. O crescimento econômico não se converte em direitos de saúde, moradia, renda, transporte, liberdade de produzir sua própria vida. O crescimento econômico tampouco se converteu em mais democracia, numa sociedade onde laços de autoritarismo, racismo e uma lógica mafiosa de gestão e compadrio ainda prevalecem. O crescimento produz uma crise própria.

Diante disso, sob a desculpa de que os governos à esquerda trabalham nos limites máximos da “correlação de forças”, sob a desculpa da “governabilidade”, têm sido sistematicamente bloqueadas e vetadas fundamentais pautas de transformação social: a legalização do aborto, a questão LGBTT, o direito à cidade, à mobilidade urbana, à resistência à opressão. Até mesmo o direito de protestar está ameaçado, quando uma histeria repressiva chancelada até por antigos ativistas de esquerda, agora pacificados num impermeável consenso governamental.

Quando uma força constituinte vem se organizando por fora das instâncias engessadas da representação no Brasil, o bloco de poder decidiu fechar as brechas, para novamente blindar o sistema político de qualquer possível “intoxicação democrática”. Este bloco agencia largo consenso na certeza de que não haja alternativas, nem elementos de autonomia e pensamento por fora dos espaços tradicionais dos partidos principais e suas ramificações organizacionais.

Manipulando comoções nacionais, obcecado com as eleições, incapaz de relacionar-se além da própria zona de conforto, em qualquer caso distante das ruas e redes, sem entendê-las, e sem entender a nova composição social (os batalhadores, os pobres, a classe sem nome) gestada no Brasil nos últimos 10 anos, na sua face produtiva e política, esse bloco multiplica acusações ante os protestos democráticos. Acusações em si mesmas contraditórias: ora são “coxinhas”, ora “pobres vendidos”; “cegos por ideologia” e “apolíticos”, “voluntaristas” e “bizantinos”, “espontaneístas” ou “forças ocultas” — tudo ao mesmo tempo. O enigma do black bloc é o principal alvo da pressa, desconhecimento ou simplesmente teleguiamento dos comentadores.

Isso só demonstra a efetividade do movimento, o quanto ele assusta, e o quanto pode realmente embaralhar os cálculos eleitorais (como no ano passado) e comprometer as certezas políticas e ideológicas de uma geração. Mas o movimento não perde tempo com essas viúvas de uma época que não volta, com quem está confortável onde está, não interessando mais radicar a ação e o pensamento nas forças vivas do tempo. Diversa é a proposta de quem entende que a esquerda não é um sujeito fixo, e que varia em função de coordenadas históricas e políticas. Ser de esquerda não é um transcendental, e não bastam boas intenções: é preciso pesquisa implicada, capacidade de escutar e relacionar-se, e sobretudo constante autocrítica sobre as trajetórias dos movimentos, suas tendências e potencialidades.

Proposta

Nesse sentido, a fim de continuar gerando e compartilhando conhecimento nas lutas e para as lutas, a UniNômade propõe um pequeno dossiê, dentro da temática, aberto a intervenções de quem deseje contribuir construtivamente. Algumas possibilidades imaginadas, em enumeração não exaustiva, seriam escrever sobre nós de organização e mobilização do movimento, sua necessária autocrítica, a formação de pautas políticas e a criação de mídia alternativas — não só como atividade de contramídia, como também requalificação da própria maneira de ser a mídia, uma mídia polifônica e fragmentária, uma mídia da multidão.

Especificações

Serão recebidos e avaliados textos dissertativos ou narrativos, entre 2.000 e 8.000 caracteres, dentro do tema proposto, para publicação no site da rede, na medida em que forem aceitos, até 24/2/2014. Podem ser inclusive pessoais, em primeira pessoa. Encaminhar os textos para hamletvictrix@gmail.com

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