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Produzir direitos, gerar o comunismo

Por Bruno Cava | Dissertação em filosofia do direito defendida na pós-graduação da FDIR/UERJ, Rio de Janeiro, 2012.

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(…) Badiou e Negri são pensadores da crise. Seu materialismo radical tem inspirado um novo modo de fazer filosofia, ou uma nova política na filosofia. Em tempos de mais uma crise generalizada do capitalismo, não admiram as ocupações e movimentos radicais piolharem de negrianos e badiounistas. Pensar da crise é o próprio materialismo, a forma marxista. Não existe materialismo marxista sem teoria da crise. Materialismo não se confunde com apego à matéria, às coisas ou à realidade objetiva. Isto seria um materialismo fisicalista ou cientificista, uma tendência do século 19 construída como alternativa à concepção religiosa do mundo e espiritualismos daqueles tempos românticos. O materialismo marxista não se concentra na matéria, o que seria apenas outro idealismo, mas na práxis. A atividade do pensamento não pode se reduzir à especulação ou esquematismos de razão pura. A verdade materialista não se define pela adequação ou prioridade dadas às coisas. Mas pelo critério da prática como mobilizador das verdades. Os dois autores são pensadores da crise porque se instalam nela como perspectiva e mundo. O pensamento se mobiliza ao deparar com os impasses, os travamentos, as perplexidades, — e todo esse encontro contínuo com as limitações e condições reais. Um e outro viveram essa crise e elaboraram a teoria a partir disso. A crise como chave de desdobramento da complexidade do real; a borda do pensamento a partir do que flui a imaginação, a hipótese como aposta e reafirmação de propósito. Frequentemente irascíveis, polemizaram contra todas as tentativas de revisionismo histórico, diante de eventos/ciclos de lutas, essas grandes crises, como a Revolução Russa ou o Maio de 1968. E se falam em derrotas históricas, não a interiorizam como derrotismo. O materialista não crê na transcendência de si mesmo ao real. Não admite ontologias fundadas no eu, na consciência, na escuta do ser. Essas teorias burguesas de que o Eu aparece para o mundo de repente, e daí tem de lidar com essa inadaptação, e angustiado escutar o ser. O Eu é desde sempre produzido, — e não aparece. Com Nietzsche, quando muito esse Eu é apenas uma doença da razão, uma paixão voltada contra si na forma da (má) consciência, uma interioridade escavada no ressentimento de não poder efetuar a própria potência de existir. Esse Eu conflagrado muitas vezes se crê transcendente apenas para lavar as mãos e não fazer nada, e acaba fazendo a apologia do status quo. O comunismo é uma práxis constitutiva e não transige com existencialismos. A crise que importa está nas relações, nos conflitos, na política, — e não na desgraça intima, na interioridade psíquica. Os dois autores não cansaram de recusar todas as manifestações do individualismo, inclusive as mais sofisticadas. Não confundir produção de subjetividade com subjetivismos burgueses, detrás do que espreita a teoria do contrato, o direito civil e o bom pai de família. (…) (p. 134, 135)

Imagem: Keith Haring, NY, 1986.

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