UniNômade

Afogados e explorados, os imigrantes do mundo

Por Círculo de cidadania, em 22/4/15

Imagem Água

Ao menos 700 imigrantes se afogaram na semana passada quando tentavam atravessar os 450 km que separam a costa da África da Europa [1]. Cerca de 100 eram crianças e adolescentes [2]. O Mar Mediterrâneo, que já foi o mar de gregos, romanos, mouros e navegadores italianos, se tornou um cemitério que sepulta corpos anônimos na água. Essa história tem se repetido: proibidos de entrar na Europa, os imigrantes apelam para barcos superlotados e inseguros.

Embora os meios de comunicação culpem os donos das embarcações e a irresponsabilidade das vítimas, o problema é maior e mais complexo. As disparidades entre as regiões do mundo provocam deslocamentos de populações que não respeitam fronteiras — fronteiras que são, por definição, arbitrárias. As migrações são antes respostas, embutem um desejo de viver melhor, de retomá-la em termos próprios, de recomeçar. É preciso muita força interior e solidariedade para realizar uma travessia ilegal. O êxodo não tem apenas uma dimensão de sofrimento: é também resistência, estratégia afirmativa de vida.

A Europa hoje tem 35 milhões de imigrantes, 6% da população residente, a enorme maioria em condições precárias. Além desses, existem milhões de filhos de imigrantes que, como os pais, não têm os direitos reconhecidos. Apesar de trazerem consigo a riqueza de trabalho e cultura, comum a toda diáspora, eles são recebidos com desdém, racismo, perseguição, criminalização e vivem ameaçados.

Se os governos da Europa se colocam como uma fortaleza, pontuada de centros de processamento que mais parecem campos de prisioneiros, no fundo o sistema econômico sobrevive da mão de obra barata dos imigrantes. É estratégico que os ilegais consigam entrar e que sejam mantidos na clandestinidade e sob perseguição permanente. Através do medo da deportação, intimidação e incerteza, os imigrantes podem ser melhor controlados, em situação desigual e com baixos salários. É o que Sandro Mezzadra, estudioso das fronteiras e migrações, chama de “inclusão diferencial”, uma forma de organização social controlada.

A melhoria econômica no Brasil nos últimos 20 anos tem atraído imigrantes também para cá. Por um lado, 600 mil brasileiros tentam a sorte emigrando para países mais ricos; por outro, já contamos mais de 1 milhão de imigrados, um aumento de quase cinco vezes entre 2001 e 2015. Estima-se que sejam 800 mil bolivianos [3], 200 mil chineses [4], 21 mil haitianos [5], e mais de 30 mil africanos de 48 países diferentes [6].

As manchetes repetem que os números preocupam, que seria preciso conter a imigração, que existe uma “crise imigratória”, falam em máfias e traficantes de pessoas. Na verdade, a crise imigratória consiste essencialmente na negação dos direitos, na fortificação das fronteiras, na manutenção de uma situação de insegurança e precariedade que favorece que os imigrantes sejam achacados em trabalho semiescravo e sujeitados a situações de humilhação, desamparo e solidão.

Estaremos nós no mesmo caminho da “fortaleza Europa”, modelo adotado por quase todos os governos do velho continente? Na ânsia de alcançar os países desenvolvidos, copiaremos também os seus mecanismos racistas de inclusão diferencial, exploração do trabalho e violência seletiva? É este o projeto do Brasil Potência? Não saberíamos fazer diferente?


Fontes:
[1] http://tinyurl.com/nrlvphu
[2] http://tinyurl.com/qxvojwa
[3] http://tinyurl.com/oeekav5
[4] http://tinyurl.com/khksruw
[5] http://tinyurl.com/lb4v3v9
[6] http://tinyurl.com/ozc2mr5

X